Duas mulheres negras disputam a Presidência contra 10 homens brancos e um pardo

Reprodução Instagram Marina Silva

Por Joana Suarez e Marcela Káritas

Na foto em preto e branco, ela aparece caminhando a passos largos, em meio à mata, de calça frouxa, blusa de botão e cabelo preso em coque alto – que virou sua marca. Olhando para baixo, como quem segue firme um trajeto, ela conduzia um grupo de pessoas: mulheres negras como ela, criança e homens (esses seguiam atrás, não à frente). Observa-se no retrato tirado há 32 anos a mulher Maria Osmarina Marina da Silva Vaz de Lima antes de ser a candidata à Presidência Marina Silva.

A fotografia foi postada no Instagram da candidata, recentemente, para desmentir uma informação falsa na internet de que ela invadia fazendas no Acre, Norte do Brasil. Na verdade, diz a legenda do post, Marina liderava uma manifestação que conseguiu impedir o desmatamento ilegal de 700 hectares de floresta.

Hoje, a imagem de Marina Silva é quase sempre transmitida como a de uma mulher fraca, corroborada por suas vestes em tons neutros, pela fala serena e andar calmo em atos de campanha. Na construção desse personagem, em um meio político machista, Marina é retratada ainda como a postulante que não sabe fazer alianças, e quase nunca é destacada como a candidata livre de qualquer denúncia de corrupção. Ela  precisa sempre reforçar em entrevistas e palanques que é mulher forte, preparada e ficha limpa.

Divulgação Marina Silva

Em 2019, completará três décadas de carreira política, iniciada em 1989 quando foi a vereadora mais votada em Rio Branco, no Acre. Depois, chegou ao posto de deputada estadual com mais votos pelo seu Estado e tornou-se a senadora mais jovem da história da República. Desde 2010, Marina tenta chegar ao mais alto cargo do país, recebendo cerca de 20 milhões de votos em cada uma das duas eleições que disputou e ficando sempre em terceiro lugar. Agora, na terceira tentativa, concorrendo pela Rede Sustentabilidade (partido criado por ela), é a terceira colocada nas pesquisas que apontam Lula (PT) em primeiro e Jair Bolsonaro (PSL) em segundo.

Nascida no interior do Acre – Estado pouco lembrado no cenário nacional –, alfabetizada aos 16 anos e formada historiadora aos 26, Marina sempre carregou a bandeira do meio ambiente. É mulher negra, nortista e pobre, de origem, mas não usa a palavra feminista – parece até evitá-la. “Eu tenho um compromisso com essa agenda, quando falo do problema das mulheres, isso faz parte da minha trajetória política”, afirmou ela em entrevista coletiva na semana passada, citando dados recentes. “Temos uma situação em que 1.133 mulheres foram vítimas de feminicídio, 60 mil estupros só em 2017, 70% foram de crianças e adolescentes”.

Nas eleições deste ano, movimentos femininos pelo país estão atuando fortemente, cobrando e promovendo visibilidade para as pautas das mulheres. Marina tem direcionado o seu discurso para reiterar que representa essa metade da população votante, mas ainda não conseguiu conquistar as feministas que militam, principalmente, nas causas e partidos tradicionais da esquerda. Nessa tentativa, a candidata da Rede tem se apresentado  mais flexível em temas prioritários para o feminismo e abriu espaço para um plebiscito sobre a descriminalização do aborto.

Marina prefere colocar a pauta da mulher no pacote das muitas “políticas públicas necessárias, que incluem aquelas voltadas para as comunidades fragilizadas, indígenas e tantas outras”. Mas uma porta-voz da Rede informou que o partido de Marina declara-se Ecofeminista, em uma perspectiva da mulher com a natureza.

“Eu estou desde os 17 anos tendo que provar que penso, tendo que provar que sei e o tempo todo eu vejo as pessoas me subestimando. Como são subestimadas as mulheres brasileiras… Porque esse lugar parece que não foi feito para nós. E quando se é negra, quando se é pobre, a gente tem que provar duas vezes, mas eu me submeto ao teste”, Marina Silva, em sabatina que participou nesta semana (Divulgação Marina Silva)

No ambiente político, a candidata da Rede já foi do PT, PV, PSB; já apoiou Lula e Aécio Neves, instabilidade que faz muitos duvidarem de sua capacidade para a governabilidade. “Eu tenho ouvido que minha candidatura não é viável, porque não tem dinheiro, não tem tempo de televisão, mas para ganhar uma eleição só é necessária uma mudança de postura do cidadão, uma frestinha”, defende.

Quando fala em fresta, ela aproveita para lembrar das dificuldades que passou para chegar aos 60 anos candidata. Começou a trabalhar aos 10  e foi empregada doméstica. “Eu passei por uma frestinha na educação e na saúde pública. Nunca me esqueço do dia em que o médico me disse que não havia mais alternativa para mim, pois eu já tinha pegado cinco malárias, estava na terceira hepatite”.

Na vida de Marina, a religião também sempre esteve presente. Era católica e converteu-se à Igreja Evangélica aos 42 anos, aderindo à linha pentecostal, motivo que provoca receio entre feministas pelo discurso bastante conservador, embora defenda o Estado laico em seu plano de governo. Também em seu programa, ela diz aprovar a união civil entre homossexuais. Marina chega, então, a mais uma disputa pela Presidência, com o desafio de cativar o eleitorado feminino, jovem e LGBT, revelando a mulher de luta que sempre foi.

Vera, a representante da extrema esquerda

“A luta pela legalização do aborto é primeiramente a luta em defesa da vida e da saúde das mulheres trabalhadoras e pobres. Aqui no Brasil, a cada quatro mulheres que morrem por abortos mal feitos, três são negras como eu”, Vera Lúcia, em vídeo pessoal durante ato na avenida Paulista (Foto: Romerito Pontes)

O Partido Socialista dos Trabalhadores Unificado (PSTU) escolheu, pela primeira vez, uma mulher para liderar sua chapa mirando a Presidência. A representante é Vera Lúcia, uma das fundadoras da legenda. A candidata nasceu e viveu parte da infância na cidade de Inajá, localizada no interior de Pernambuco. Aos 11 anos, mudou-se para a periferia da capital do Sergipe, Aracaju. Começou a trabalhar aos 14 anos como garçonete e, aos 19, iniciou a militância sindical. Operária sapateira, a candidata integrou o movimento sindicalista e foi filiada ao PT entre 1992 e 1993.

Vera Lúcia argumenta que sua chapa é a única da esquerda disposta a defender plenamente os direitos dos trabalhadores. Para alcançar esse objetivo, ela acredita ser necessária uma revolução, nos moldes da Revolução Russa de 1917. Durante a convenção, em março deste ano, o PSTU lançou o manifesto “Um chamado à Revolução! Um projeto socialista”. O documento alega que a mudança da realidade brasileira não será concretizada pelas eleições, mas sim através de greves gerais, manifestações e ocupações.

Em seu plano de governo, a candidata defende 16 propostas, entre elas aumentar o tempo do seguro-desemprego para dois anos e quadruplicar o salário mínimo, para R$ 3.804,06. Se eleita, Vera Lúcia também promete revogar todas as reformas que acarretaram em perda de direitos dos trabalhadores. A candidata também quer estatizar as 100 maiores empresas do país.

No tocante às pautas das mulheres, o programa de Vera segue a mesma linha e foca na defesa da trabalhadora. Mas peca ao não apresentar caminhos concretos para isso. Vera Lúcia garante ainda que vai promover a igualdade de direitos entre homens e mulheres, além de do aborto livre e gratuito no sistema de saúde pública. Propostas aparentemente um tanto ousadas, mas não para uma presidente revolucionária.

Campanha Libertas[email protected]

Somos um coletivo de mulheres jornalistas de Minas que já trabalharam em redações de grandes jornais de BH e em assessorias de imprensa. A Campanha Libertas – Por mais mulheres na política surgiu para fazer uma cobertura jornalística independente sobre as eleições de 2018 com foco nas mulheres.

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