‘Milton Bituca Nascimento’: documentário registra últimos momentos do artista pelos palcos

11/03/2025 às 15h41
Documentário entra em cartaz no próximo dia 20 de março (Milton Bituca Nascimento/Reprodução)

Após 110 minutos de exaltação à Bituca, parte do público presente na sessão de pré-estreia do documentário ‘Milton Bituca Nascimento’ em Belo Horizonte, na noite dessa segunda-feira (10), não se privou de aplaudir de pé a obra comandada pela diretora Flávia Moraes. O longa-metragem, que chega às salas de cinema em 20 de março, aponta, a muitos dedos, a grandiosidade da estrela-mor da música mineira, acompanhada de perto pela produção por mais de dois anos, sobretudo pelo tempo da turnê de despedida dos palcos, ‘A última sessão de música‘. Pelas muitas esquinas que o filme se envereda, porém, numa, se perde: a da expectativa.

Num apanhado de relatos de ‘figurões’ das músicas brasileira e internacional, o documentário reflete sobre o alcance de Milton na cultura popular, em lutas sociais e na mobilização de talentos em ambientes particulares. A seleção privilegiada de vozes que narram a força artística de Bituca reforça o caráter global de sua obra, envolta em poesia mineira e mineral, mas não menos cosmopolita. Para tanto, o longa se apoia num fio condutor, o trilho que leva espectadores à viagem cinematográfica: o último passeio de Nascimento como cantor por terras nossas e estrangeiras, entre 11 de junho e 13 de novembro de 2022.

Na ala internacional de relatos, o filme reúne referências do jazz estadunidense, como Wayne Shorter e Herbie Hancock; amigos pessoais de Bituca, como Paul Simon, Quincy Jones e Stanley Clarke; admiradores e ex-companheiros de palco, como Steve Jordan, Spike Lee e Esperanza Spalding; entre outros. Estes, que ainda não sabem do lixo ocidental, mas reverenciam, incondicionalmente, a música feita por Milton.

Do outro lado, o da América do Sul, o documentário traz falas de Sérgio Mendes, Chico Buarque, Caetano Veloso, João Bosco, Gilberto Gil, Simone, Ivan Lins, Djavan e companhia limitada. Traz, também, passagens de representantes mais jovens da música brasileira, como Djonga, Criolo, Maria Gadú, Zé Ibarra, Tim Bernardes, entre outros. De forma bastante tímida, os amigos de Clube da Esquina se apresentam no filme, entre eles, Lô Borges, Beto Guedes, Toninho Horta, Wagner Tiso, Ronaldo Bastos e Márcio Borges. Fernando Brant, letrista e um dos fundadores do movimento, falecido em 2015, é recordado em menção honrosa.

Spike Lee e Milton Nascimento (Milton Bituca Nascimento/Reprodução)

Desafio

Antes mesmo do início da exibição do filme, a ‘vereda’ da expectativa parecia preocupar Flávia Moraes. Em conversa com o BHAZ nos bastidores da pré-estreia, a diretora chegou a entitular o filme como um road movie, gênero cinematográfico no qual o personagem principal deixa o conforto para uma viagem, e não um documentário. “Nós tínhamos alguns conceitos, algumas ideias sobre o filme, mas a alma dele, a gênese, é a estrada”, explicou, ainda no hall de recepção de jornalistas e convidados. “Eu espero que as pessoas entendam isso”.

Fato é que, por ser vendido como documentário, o longa imprime mesmo certa expectativa sobre novidades, revelações ou casos inéditos de Bituca. Nesse sentido, o filme até passa por um lado mais pessoal do artista — retoma, por exemplo, a história do menino nascido no Rio de Janeiro e criado em Três Pontas, no Sul de Minas, e a luta que enfrentou frente ao racismo estrutural da sociedade brasileira —, mas sem muito afinco quanto a curiosidades. “Não há novidades para trazer sobre Milton. A grande novidade desse filme é convidar você para a intimidade dele nesse momento que é tão delicado, tão frágil”, disse Flávia, remetendo ao momento da turnê de despedida. “Todo mundo já sabe da vida do Bituca”, complementou.

Cumprindo a expectativa ou não, sobre uma coisa o público e a diretora devem concordar: ‘Milton Bituca Nascimento’ é resultado da generosidade de um artista que, no auge da sua carreira, chega, também, ao encerramento dela. “Nós decidimos acompanhar o Milton para o que desse, para o que fosse. Momentos de euforia, de dificuldade, de cansaço. O filme vai viajando com Milton e lavando o público para viajar com ele”, sintetizou Moraes. “É um retrato quase naïf desse momento em que ele tá fragilizado, velhinho, e que tá maior do que nunca”, acrescentou.

Na construção dessa jornada, o maior desafio foi, segundo a diretora, “acreditar que as coisas iam acontecer da forma como aconteceram”. A fala antecipa a temporalidade da obra, que contradiz a lógica de uma narrativa cronológica, mas deságua no lugar que todos esperavam: a primeira — e talvez a mais importante — esquina, aquela do Clube, o Belo Horizonte. “Essa viagem nos traz justamente para Minas, para o último show no Mineirão, e aí o filme fica emocional, fica colorido, o filme se transforma”, revelou Flávia antes do primeiro frame pintar no telão.

No fim, o que se vê no road movie — ou documentário, que fica a critério do espectador — nada mais é do que o que se canta quando o repertório de Bituca vem à mente. “O tempo é travesso, a vida, travessia”.

Milton Nascimento e Augusto Nascimento (Milton Bituca Nascimento/Reprodução)

Ficha técnica

‘Milton Bituca Nascimento’ é uma produção do Canal Azul, Gullane, Nascimento Música e Claro, em associação com Why? Stories Matter, Vital Studios e MoonSailor. O documentário conta com distribuição da Gullane+ e com o apoio da Secretaria da Cultura, Economia e Indústria Criativa do Estado de São Paulo e do Ministério da Cultura, através da Lei Paulo Gustavo, e apoio institucional da Ancine.

Direção: Flavia Moraes
Roteiro: Marcélo Ferla e Flavia Moraes
Consultoria Artística: Augusto Nascimento
Direção de fotografia: Pedro Rocha
Montagem: Laura Brum e Flavia Moraes
Direção Musical e Trilha Sonora Original: Victor Pozas e Rafael Langoni
Música: Milton Nascimento
Produção Executiva: Liz Reis, Gabriela Tocchio, Ana Saito, Pablo Torrecillas
Produzido por: Augusto Nascimento, Ricardo Aidar, Larissa Prado, Andre Novis, Caio e Fabiano Gullane
Produtores associados: Flavia Moraes, Victor Pozas, Rafael Langoni
Produção: Canal Azul, Gullane, Nascimento Música e Claro
Distribuição: Gullane+

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Classificação etária: Livre
Entrada: Gratuita

Thiago Cândido

Jornalista pela UFMG. Repórter no BHAZ desde 2023. Participou de reportagem vencedora do Prêmio CDL/BH de Jornalismo 2024.

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