‘Tive vergonha e medo’: Jornalista denuncia presidente do PT de Contagem por estupro e agressões

Lyvia Prais
Em vídeos publicados nas redes sociais, Lyvia detalha as agressões que denuncia ter sofrido, entre tapas, mordidas e socos (Reprodução/@lyvia_prais/Instagram)

A jornalista mineira Lyvia Prais acusa o presidente do PT (Partido dos Trabalhadores) de Contagem, Miguel Ângelo Andrade, de violência doméstica e estupro durante o relacionamento dos dois, entre 2013 e 2015. Em vídeos publicados nas redes sociais, ela detalha as agressões que denuncia ter sofrido, entre tapas, mordidas e socos. O homem nega as acusações e o Partido dos Trabalhadores afirma que acompanha o caso (leia mais abaixo).

“Isso acontece com muitas de nós. Eu sou brava, sempre fui nervosa, brigona, questionadora. Eu fui criada para questionar as injustiças do mundo, do machismo, do patriarcado. E é justamente por isso que eu fui atacada desde o início, porque eu não permitia que ele gritasse comigo, mandasse em mim, me proibisse de alguma coisa. Não aceitava ser tratada como um objeto, e aí que aconteceu”, conta a jornalista.

De acordo com Lyvia Prais, de 27 anos, as agressões começaram quando o então namorado a acusou de “agarrar” uma colega de trabalho no banheiro, quando as duas entraram no local para fumar. “Dentro do carro ele começou a me xingar, me chamar de lésbica, falar que eu estava agarrando essa mulher lá dentro. E quando gritam comigo eu grito mais alto, e ele me deu um tapa na cara”, detalha.

“Eu não sabia o que fazer, e foram mais dois tapas na cara, com o carro andando. Eu quis pular do carro em movimento e comecei a gritar socorro. Ele deu a volta no quarteirão e parou, e eu saí correndo. Eu ligava para a minha mãe e não conseguia. Dali pra frente foi o fim, e foi o inferno até eu sair de lá”, completa.

Coragem para denunciar

Em conversa com o BHAZ, Lyvia conta que na época das agressões ela não tinha forças para contar o que estava acontecendo a outras pessoas, ainda que os hematomas deixados em seu corpo falassem por si só. Foi só depois de começar a fazer terapia que ela se sentiu pronta para abordar o caso e tomar todas as medidas necessárias.

“Na época eu não tive coragem de denunciar, tive vergonha e também fiquei com medo de perder meu emprego na época. Não queria voltar para a minha cidade sozinha, desempregada, sem diploma e violentada”, relata.

Mais denúncias

Ao longo do depoimento publicado em sua rede social, a jornalista relembra outras situações em que teria sido agredida por Miguel Ângelo. Após uma confraternização com amigos, ele teria acusado Lyvia de “dar mole” para um dos colegas presentes, antes de chamá-la de “puta”, “safada”, e agredi-la.

Ela ainda confessa que agredia o homem de volta, defendendo que “não ia apanhar quieta”. “Eu apelei, ele me deu soco, puxou meu cabelo, mordeu minha bochecha, me deu tapa na cara. Eu empurrei ele da cama, enchi ele de chute na barriga, na cabeça”, conta.

Ainda segundo o relato, amigos teriam visto a marca da mordida na bochecha de Lyvia e perguntado se Miguel estaria batendo nela, mas ela negou: “movida pelo orgulho, disse: ‘não, de jeito nenhum, se ele me bater eu mato ele'”. Em outra situação, ele teria acusado a então namorada de flertar com o noivo durante um casamento, antes de agredi-la quando o casal chegou em casa.

“Ele me trancou no apartamento e foi para a casa da mãe dele todo machucado, depois que me machucou. Me bateu muito, jogou meu celular na parede. Liguei para a minha mãe e falei que um de nós ia morrer naquela situação. Ela dirigiu por três horas com meu padrasto para me encontrar”, conta.

Acusação de estupro

Depois dessa situação, Lyvia Prais contou à mãe que estava sendo agredida em casa e obteve ajuda para sair do local. Segundo ela, seu sogro, pai de Miguel, também a ajudou a conseguir deixar a casa em que o casal morava junto. Mas, na sua última noite lá, ela afirma ter sido estuprada.

“Foi difícil sair de tudo isso, eu fui violentada de várias formas, eu vi a morte de perto. Eu fui estuprada na última noite antes de sair de casa, de madrugada. Eu já não tinha nada com ele há meses, não imaginava que eu pudesse passar por aquilo. Peguei uma IST (Infecção Sexualmente Transmissível) grave, tive que tratar, e depois ele me acusou de ter passado a DST para ele”, conta.

Mais uma vez

E os abusos não terminaram aí. No último dia 24 de julho, Lyvia disse ao BHAZ que foi abordada por Miguel Ângelo enquanto participava de um ato contra Bolsonaro, na Praça da Liberdade. Segundo ela, ele a obrigou a pegar em sua mão. “Eu gelei, porque mesmo que hoje eu já esteja amparada psicologicamente, nenhuma mulher quer pegar na mão do seu abusador”, conta.

Procurada pelo BHAZ, a Polícia Civil afirmou que Lyvia Prais compareceu à Delegacia Especializada de Plantão de Atendimento à Mulher em 7 de agosto e fez o requerimento de medidas protetivas de urgência, que foram encaminhadas ao Poder Judiciário. A corporação instaurou procedimento investigativo para apurar as denúncias.

“Tive essa conquista no aniversário da Lei Maria da Penha e agora eu só espero que ela seja cumprida”, disse a jornalista.

‘Partidarizaram meu caso’

Depois da publicação de seu relato, Lyvia conta que viu diversas pessoas condenando o partido, do qual ela foi filiada até 2017. E, embora ela não apoie as críticas que se ancoram em polarização política, ela disse ainda não ter recebido apoio por parte do PT.

“As pessoas partidarizaram meu caso, e eu não queria isso. Mas algo que me deixou bastante desapontada foi que o partido não me deu acolhimento. Fiz a denúncia formal na Secretaria de Mulheres do PT Estadual e não foi me dada resposta. Eu cheguei a solicitar apoio jurídico, para que eu pudesse dar prosseguimento à denúncia, mas me foi negado. Só agora depois de toda a repercussão que marcaram uma reunião comigo amanhã (13)”, disse.

Apesar disso, ela diz ter hoje uma forte rede de apoio para que consiga dar continuidade ao processo. “Atualmente eu tenho apoio da minha terapia, do meu atual marido, da minha família e dos meus amigos, que não são muitos. Também construí uma rede de apoio muito grande pelas redes sociais, quando postava meus relatos com crise de pânico e outros transtornos que desenvolvi depois dos abusos”, conta.

Por fim, a jornalista quer que seu relato dê força a outras mulheres que também passam, diariamente, por tudo que ela viveu. “A minha história e a minha experiência de dor eu quero usar de luta, para que outras tantas mulheres, vítimas de tantas violências, tenham força para denunciar”, disse.

PT acompanha o caso

Procurado pelo BHAZ, o PT informou que acompanha o caso por meio da Secretaria Estadual de Mulheres. “A luta contra o machismo, contra a violência e a favor das mulheres é um princípio básico do PT. Sempre tratamos com rigor, transparência e justiça qualquer denúncia apresentada”, diz nota (leia na íntegra abaixo).

Acusado nega

O presidente do PT de Contagem, Miguel Ângelo Andrade, nega as acusações feitas por Lyvia Prais. Também por meio de nota enviada ao BHAZ, ele afirma que a jornalista não tem provas da denúncia e que a questão será resolvida nos âmbitos policial e judicial.

“Vi com indignação as ‘estórias’ envolvendo o meu nome, veiculadas em redes sociais pessoais, e esclareço que as acusações são mentirosas. Diga-se de passagem, passados quase seis anos da separação, somente no último sábado (7/9), a denunciante procurou a Delegacia de Mulheres para registrar suas fantasiosas denúncias, as quais não pode comprovar, pois representam denunciação caluniosa”, diz a nota (leia na íntegra abaixo).

Nota da Polícia Civil

A vítima, de 27 anos, compareceu no dia 7 de agosto deste ano na Delegacia Especializada de Plantão de Atendimento à Mulher, em Belo Horizonte, para registrar a ocorrência, ocasião em que fez o requerimento de medidas protetivas de urgência, sendo estas encaminhadas ao Poder Judiciário. A PCMG instaurou um procedimento investigativo para apurar os fatos e a investigação tramita na Delegacia Especializada de Atendimento à Mulher de Contagem. Outras informações serão prestadas em momento oportuno”.

Nota do PT

“A luta contra o machismo, contra a violência e a favor das mulheres é um princípio básico do PT. Sempre tratamos com rigor, transparência e justiça qualquer denúncia apresentada. O caso citado está sendo acompanhado pela Secretaria Estadual de Mulheres, que, após analisá-lo, tomará as medidas cabíveis de acordo com o Estatuto.

Andréa Cangussú
Secretária de Mulheres do PT MG”

Nota de Miguel Ângelo Andrade

“Vi com indignação as ‘estórias’ envolvendo o meu nome, veiculadas em redes sociais pessoais, e esclareço que as acusações são mentirosas. Diga-se de passagem, passados quase seis anos da separação, somente no último sábado (7/9), a denunciante procurou a Delegacia de Mulheres para registrar suas fantasiosas denúncias, as quais não pode comprovar, pois representam denunciação caluniosa.

Sabedor da atuação séria deste veículo, alerto para o fato de que quem me acusa não apresenta quaisquer evidências. E não poderia ser diferente, uma vez que as acusações são falsas, sem contemporaneidade e criminosas.

Registro o avanço representado pela Lei Maria da Penha no combate à violência contra a mulher, mas o que me parece é que a alegada vítima adota uma estratégia que tem se tornado cada vez mais comum nestes tempos de pós-verdade: a de veicular insistentemente uma mentira nas mídias sociais, na tentativa de que, mesmo sem qualquer fundamento, ela possa, inadvertidamente, ser tomada como verdade.

Felizmente, a maioria das pessoas percebe tal estratégia enganosa, e são inúmeras as manifestações de solidariedade que tenho recebido.

Por fim, a questão será resolvida nos âmbitos policial e judicial, espaços legítimos para que ela apresente as provas de suas acusações e onde deverá ser esclarecida sua real motivação no sórdido propósito de imputar crime a quem sabe ser inocente”.

Edição: Vitor Fernandes
Sofia Leão[email protected]

Repórter do BHAZ desde 2019 e graduada em jornalismo pela UFMG (Universidade Federal de Minas Gerais). Participou de reportagens premiadas pelo Prêmio Cláudio Weber Abramo de Jornalismo de Dados, pela CDL/BH e pelo Prêmio Sebrae de Jornalismo em 2021.

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