Cobertura de massacre em escola é alvo de crítica: ‘Prefere o entretenimento do que a informação’

Reprodução/Twitter

Este ano não chegou nem mesmo ao fim do primeiro trimestre, mas as tragédias (tais quais rompimento da barragem em Brumadinho, incêndio no Centro de Treinamento do Flamengo e massacre em Suzano) têm abalado especialmente o Brasil. E, mais uma vez, a cobertura da imprensa – parte dela, obviamente – tem sido questionada por leitores, telespectadores e até mesmo especialistas.

Desta vez, as críticas são em relação à postura no tiroteio em uma escola em Suzano, na região metropolitana de São Paulo, protagonizada por dois jovens, nessa quarta-feira (13). O massacre resultou em 10 óbitos, incluindo os dois criminosos, que tiraram a própria vida.

Dois vídeos em especial viralizaram pelas redes sociais – ambos questionando a postura de jornalistas. Em um deles, um repórter da Band News aborda a mãe de um dos atiradores, Tatiana Tucci, logo após o massacre. “Por que o Guilherme fez isso? Ele tinha motivo para isso? Era um bom filho?”, dispara o jornalista logo no início da abordagem.

“É importante você falar para defender a honra da sua família! Você se sente culpada?”, continua, em uma entrevista que dura mais de dois minutos. Durante todo o tempo, a mulher, visivelmente constrangida (o filho tinha acabado de participar da autoria de uma chacina e se matado em seguida), tenta esconder o rosto e pede para “ter paz”.

Outro vídeo é protagonizado por uma repórter do SBT, que aparece ao vivo esbaforida. “Eu acabei de chegar. Corri bastante. As famílias estão em busca de informação”, diz, ofegante. Após diversas recusas de entrevista (o massacre tinha acabado de ocorrer, com informações desencontradas até mesmo das autoridades), uma abordada grita: “Eu não quero falar!”.

‘Atrair audiência’

Na tragédia da Vale, em Brumadinho, a postura de outra jornalista (veja mais abaixo) já tinha sido alvo de questionamento. Mas por qual motivo essas críticas estão ocorrendo? A imprensa mudou a postura ou as críticas ficaram mais acessíveis com as redes sociais? Ou, ainda, os questionamentos têm fundamento?

Têm, respondem dois especialistas em comunicação ouvidos pelo BHAZ. “O jornalismo de TV prefere o entretenimento do que a informação. Ele abdicou disso e passou essa responsabilidade para a internet, rádio e impresso. Logo o espetáculo ganha força nas coberturas e os repórteres são pressionados a fazerem isso, para que assim consigam audiência”, afirma o professor da Una e jornalista Cláudio Magalhães.

“O que a TV faz tem o objetivo de atrair audiência. Os valores e limites do jornalismo são deixados e pensa-se apenas na venda do produto. No caso da Band News, o profissional tinha certamente a consciência que falar com a mãe mesmo que ela não aceitando é invasivo. Ele deveria ter respeitado”, corrobora a professora e coordenadora do curso de Jornalismo da PUC Minas (Pontifícia Universidade Católica de Minas Gerais), Viviane Maia.

Mas a culpa é toda do repórter? “Colocar a responsabilidade somente no repórter é complicado. Muitas vezes o editor ordena que ele consiga provocar lágrimas nos entrevistados. O repórter de TV é uma mera peça na engrenagem, ele recebe a pauta e tem que cumpri-la”, responde Magalhães.

“Isso não redime a parcela de culpa dele, pois como conhecedor da ética jornalística, ele deveria ter habilidade para dominá-la em casos como o de Suzano”, pondera.

E a academia tem parcela de culpa? “O debate é feito, mas em situações como essa o problema não é a formação. A lógica televisiva é audiência. Entre a graduação e o mercado de trabalho existe um fosso gigante e aí temos casos como esse”, analisa Maia.

Episódios como o de Suzano não são os primeiros onde a cobertura jornalística é questionada. Recentemente, parte da cobertura da Globo Minas também foi alvo de críticas pela conduta no rompimento da barragem da mineradora Vale S.A., em Brumadinho.

“Não será a última vez que veremos isso. Esse estilo do jornalismo televisivo ronda toda o mundo e nele a procura por audiência acontece a todo tempo. Acredito que a TV precisa rever seu papel, pois temos uma crise de identidades. Piorar é muito difícil, pois já estamos muito ruins, mas é preciso que aconteça uma autoanálise”, concluiu Cláudio.

Repercussão

A atitude dos profissionais da Band e SBT, no massacre ocorrido em Suzano, foi repudiada na internet e classificada como “invasiva” e “falta de bom senso” por alguns internautas.

“Gente, a Márcia Dantas correndo que nem uma louca. Pra que gritar? Tem que ter controle”, “Pra que mandar essa repórter tentando entrevistas as pessoas desesperadas? Bem desnecessário” foram alguns dos comentários.

Com relação ao repórter da Band, as críticas foram ainda mais pesadas. “Abordagem extremamente infeliz e desrespeitosa com a mãe de um dos assassinos no massacre de Suzano”, “Essa mãe deve estar sofrendo tanto ou até mais que as outras e esse repórter fazendo isso”, postaram os internautas.

Vitor Fórneas[email protected]

Repórter do BHAZ de maio de 2017 a dezembro de 2021. Jornalista graduado pelo UniBH (Centro Universitário de Belo Horizonte) e com atuação focada nas editorias de Cidades e Política. Teve reportagens agraciadas nos prêmios CDL (2018, 2019 e 2020), Sebrae (2021) e Claudio Weber Abramo de Jornalismo de Dados (2021).

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