Fãs de Pelé recordam paqueras, humildade e muita música nos primeiros passos do Rei do Futebol em Santos

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BHAZ ouviu fãs do ídolo e acompanhou de perto a Vila Belmiro, onde acontece o velório (Nicole Vasques/BHAZ)

Inigualável, incomparável e “mirabolante”. Esses são alguns dos adjetivos usados para descrever Edson Arantes do Nascimento, que deixou um legado histórico para o esporte brasileiro. O velório de Pelé, o Rei do Futebol, teve início às 10h desta segunda-feira (2), na Vila Belmiro, e reuniu fãs do mundo inteiro. Embaixo de um sol intenso, idosos, adultos e crianças aguardaram para se despedir do mineiro de Três Corações.

Na fila quilométrica que tomou o entorno do estádio alvinegro, em Santos, o BHAZ conversou com fãs que acompanharam de perto a ascensão de Pelé. O que não falta são recordações da humildade e carisma do ídolo, que morreu nessa quinta-feira (29) aos 82 anos, após uma internação para tratar um câncer no cólon.

Já na adolescência, o talento de Pelé com a bola nos pés impressionava. O Rei do Futebol marcou mais de 1.200 gols ao longo da carreira, a maioria deles pelo Santos, onde foi bicampeão mundial e levantou 45 taças. Hoje, sua despedida emociona pessoas de todas as idades, que celebram o impacto que Pelé, de alguma forma, deixou em suas vidas.

Ruas de Santos são enfeitadas com as cores da seleção brasileira em dia de velório de Pelé
Ruas de Santos homenageiam Pelé, o Rei do Futebol (Nicole Vasques/BHAZ)

‘Estrondoso, fora do comum’

Cláudio Rodrigues Reis, aposentado de 68 anos que acompanhou a multidão em frente à Vila no início do velório, era roupeiro do Santos quando Pelé ainda era “moço novo”. Ele não trabalhava diretamente com os jogadores profissionais, mas, ainda assim, vibrou com as conquistas do mineiro que se tornou referência mundial para os amantes do esporte.

“Naquela época, eu entrei por uma porta sem querer e vi o vestiário do Pelé. Era um vestiário de bronze, com todas as iniciais dele”, conta ao BHAZ. Cláudio se aposentou como zelador de guarita, mas recorda com louvor e emoção a época que viveu como funcionário do time alvinegro.

Cláudio usa boné do Santos e narra experiência com o time (Nicole Vasques/BHAZ)

Além dos vários romances vividos por Pelé, o idoso entrega uma curiosidade sobre a vida amorosa agitada do Rei: “Ele ficou quase um mês querendo paquerar minha irmã. Ela falou pra mim. Porque naquela época ela saía do Liceu São Paulo [escola particular de Santos] e andava com aquela Mercedes amarela com preta atrás dela”, diverte.

Recordando os passes históricos do futebolista, Cláudio transborda tristeza pela morte do ídolo: “A gente fica triste porque o Pelé foi um homem, um artista, fora do comum. Foi um gênio que marcava gol e ninguém segurava. Se chegassem quatro homens do lado dele, não conseguiriam pegar a bola. Ele era estrondoso, era fora do comum. Era um malabarista do futebol”.

Influência dentro e fora de campo

Já o físico Carlos Alberto Stechhahn, 63, conta como Pelé marcou sua infância enquanto santista. Horas antes de se despedir do Rei, ele narrou à reportagem que o futebolista sempre foi uma influência para ele, que cresceu jogando bola.

Carlos Alberto continuou a torcer pelo Santos mesmo após a aposentadoria do camisa 10. “Eu acompanhei esses jogos em que o Pelé jogava junto do Edu. Eles já estavam um pouco mais velhos, mas era uma emoção muito grande”, recorda.

Quando Carlos tinha somente 12 anos, a Vila Belmiro costumava abrir os portões meia hora antes do término do jogo para que as crianças acompanhassem de pertinho a Torcida Jovem. E o grupo de amigos de Carlos Alberto era tão fanático por Pelé que eles brincavam até mesmo sobre a hipótese de “pular o muro” da casa do jogador. 

Emotivo, ele comenta sobre a partida do Rei: “Na verdade, eu chorei. Porque é um ídolo nosso. Pra mim, particularmente, é o maior do mundo no futebol. Atingir o que ele fez, mais de 1200 gols, os modelos de gols. O jeito que ele fazia a bola no pé passar por cinco pessoas…”, diz, emocionado.

Carlos Alberto se despede de Pelé em velório na Vila Belmiro
Carlos Alberto na fila do estádio para ver o Rei Pelé (Nicole Vasques/BHAZ)

Além de atleta… musicista?

No entorno da Vila, o BHAZ descobriu que, além de futebolista, Pelé “arriscou” uma carreira como músico. É isso mesmo: o Rei do Futebol marcou a infância de Eduardo Pereira Alves, 60, com um violão na mão e algumas canções brasileiras.

“A gente brincando na rua, sempre chegava o Pelé com o violãozinho dele. E ele chegava, via a gente ali e falava: ‘e aí, meus amigos! Vamos escutar música?’. Puxava a gente pra dentro da casa, colocava a gente sentado e ficava ali no meio. Aí, ele cantava, cantava, passava a tarde cantando a música dele pra nós”, recorda o fã no velório de Pelé.

Eduardo narra que a “cantoria” de Pelé se tornou um hábito. Uma vez por semana, ele procurava as crianças e começava a tocar. “Ele sempre estava naquela casa, sempre aparecia ali pra tocar. A gente era vizinho. Ele chegava na calçada e a gente: ‘Pelé, Pelé!’. E ele: ‘Oi, meus amiguinhos’. Eu era muito pequeno, mas ele gostava de bossa nova, cantava música brasileira”.

O senhor mora em frente à Vila Belmiro e conta que, antes da reforma, conseguia assistir aos jogos sem sair de casa. “Minha casa era de três andares, então no último andar a gente via o jogo. Eu vi o Pelé treinando, ele andava aqui na rua numa simplicidade. Se você parava ele na calçada pra cumprimentar, ele parava e conversava com você”.

Eduardo presta homeagem a Pelé e ao Santos (Nicole Vasques/BHAZ)

‘De uma simplicidade inacreditável’

Segundo o santista, Pelé protagonizou outro momento marcante, desta vez para sua família. Quando crianças, os filhos dele representavam o clube do Santos em competições de karatê e dança. Em um certo dia, na década de 1980, ele teve uma atitude que Eduardo considera nobre.

“Minha esposa levava as crianças, se não me engano era no segundo ou terceiro andar. Numa época ela entrou no elevador, veio um segurança e pediu pra ela se retirar. Ela questionou por que e ele disse: ‘o Pelé vai entrar’”.

Quando Pelé apareceu, deu uma “bronca” no segurança por ter sugerido que a família deixasse o elevador. “O Pelé chegou: ‘com licença, segurança. Por que você tá pedindo pra retirar as crianças e a senhora? Não. Eu que tenho que pedir licença para ela para entrar’”, teria dito.

Segundo Eduardo, Pelé estava acompanhado do filho Edinho. Ele pediu licença à senhora e pediu desculpas, gerando uma boa recordação que a família guarda até hoje.

Passado e presente que se unem

“Ele quer ser o verdadeiro Neymar, e o Neymar se inspirou em quem? No Pelé!”. Essa é a frase de uma mãe que aguardava com o filho de 12 anos, Paulo Henrique, para dar um último adeus a Pelé, no velório do Rei na Vila Belmiro.

Natural de Sergipe, Valdinete explica que veio morar em São Vicente [cidade vizinha de Santos] aos 20 anos. Hoje, aos 51, ela se diz fã do Pelé assim como seus sogros, marido e filho.

“Meu sogro, minha sogra, meu marido eram fãs do Pelé, né. E eu continuei junto com eles”, narra. Para a família, que chegou na fila para prestigiar o ídolo, a morte do futebolista é doída. No entanto, a expectativa é de que talentos promissores como os de Paulo Henrique carreguem o legado de Pelé daqui em diante.

Valdinete e o filho, Paulo Henrique, que se inspira em Neymar e Pelé (Nicole Vasques/BHAZ)

Santos homenageia Pelé

Pela cidade, e principalmente no entorno da Vila Belmiro, o sentimento é de gratidão. Apesar do luto, paulistas, brasileiros de outro estado e até mesmo visitantes estrangeiros aproveitam a oportunidade de dar adeus ao ícone do futebol.

Nascido em Três Corações, no Sul de Minas Gerais, Pelé mudou-se com a família para Bauru, no interior de São Paulo, ainda na infância. Lá, iniciou a carreira no Santos com apenas 15 anos, estreando já na equipe principal, em um amistoso contra o Corinthians.

Pela seleção brasileira, Pelé despontou na Copa do Mundo de 1958, aos 17 anos, levando o Brasil ao primeiro título do torneio mundial.

Em 1962, o ele estava na seleção que conquistou o bi, mas se lesionou no começo da competição.

Foi em 1970, na Copa do Mundo do México, que Pelé traçou sua obra-prima, conquistando o tri na seleção que para muitos é a maior de todos os tempos.

O corpo de Pelé chegou à cidade caiçara por volta das 3h40 desta segunda-feira. O translado partiu do Hospital Albert Einstein, em São Paulo.

Confira fotos do entorno da Vila Belmiro, no velório de Pelé:

Vila Belmiro hoje, preparada para o Velório de Pelé (Nicole Vasques/BHAZ)
Torcedores e fãs aguardam para se despedirem de Pelé (Nicole Vasques/BHAZ)
Comerciantes locais vendem camisas do Brasil com o nome de Pelé (Nicole Vasques/BHAZ)
Nicole Vasques[email protected]

Jornalista formada pela Universidade Federal de Minas Gerais (UFMG), escreve para o BHAZ desde 2021. Participou de reportagem premiada pela CDL/BH em 2022.

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