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Prestes a ser ampliado, projeto do governo de Minas para escolas com gestão privada tem evasão como desafio

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A Escola Estadual Maria Andrade Resende, em BH, é uma das três do projeto-piloto do Somar (Google Street View)

Prestes a ser ampliado, o projeto do governo de Minas Gerais que realiza gestão compartilhada com a iniciativa privada para administrar escolas da rede estadual tem como um dos principais gargalos a evasão escolar. Dados obtidos pelo BHAZ, via Lei de Acesso à Informação, mostram que, nos dois anos de teste do Projeto Somar, duas das três escolas-piloto não alcançaram a meta de permanência dos estudantes nas unidades.

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Em 2023, a meta era de que a evasão não superasse os 5%. Os índices, no entanto, foram ultrapassados e terminaram em 8% nas escolas estaduais Maria Andrade Resende, no bairro Garças, e Francisco Menezes Filho, no bairro Ouro Preto, ambas em Belo Horizonte. Na escola Coronel Adelino Castelo Branco, no centro de Sabará, a meta foi cumprida e atingiu 5%, no limite estabelecido.

No ano anterior, os índices de evasão já haviam sido superados em número bem acima da meta estipulada que, em 2022, era de 10%. A escola Maria Andrade Resende apresentou evasão de apenas 0,4%. No entanto, a escola Coronel Adelino Castelo Branco alcançou 14,1% de evasão, enquanto na escola Francisco Menezes Filho o número foi ainda pior: 25,6%.

Veja a meta de evasão escolar e o resultado alcançado em cada unidade:

  • 2023

Escola Estadual Maria Andrade Resende

Meta de evasão: 5%
Índice de evasão atingido: 8%

Escola Estadual Francisco Menezes Filho

Meta de evasão: 5%
Índice de evasão atingido: 8%

Escola Estadual Coronel Adelino Castelo Branco

Meta de evasão:: 5%
Índice de evasão atingido: 5%

  • 2022

Escola Estadual Maria Andrade Resende

Meta de evasão: 10%
Índice de evasão atingido: 0,4%

Escola Estadual Francisco Menezes Filho

Meta de evasão:10%
Índice de evasão atingido:25,6%

Escola Estadual Coronel Adelino Castelo Branco

Meta de evasão: 10%
Índice de evasão atingido: 14,1%

Causas da evasão escolar

Segundo o Observatório de Educação, enquanto abandono escolar acontece quando o estudante deixa de frequentar as aulas durante um ano letivo e retorna em algum momento, a evasão acontece em situações em que o aluno não retorna à escola.

Na avaliação do governo do Estado, o problema ainda tem influência da pandemia de Covid-19 – fenômeno que não seria exclusivo do estado. “Muitos jovens tiveram a necessidade de sair da escola para trabalhar, o que acabou gerando abandono e evasão”, explica a subsecretária de Desenvolvimento da Educação Básica de Minas Gerais, Kellen Senra.

Questionada sobre a média de evasão escolar dos dois últimos anos em Minas Gerais, a Secretaria Estadual de Educação de Minas Gerais (SEE-MG) informou que o único dado disponível é referente ao biênio 2020/2021, calculado pelo Instituto Nacional de Estudos e Pesquisas Educacionais Anísio Teixeira (Inep) do Ministério da Educação (MEC). O índice, segundo a pasta, ficou em 11,8% no ensino médio, que é a etapa educacional oferecida nas três escolas-piloto do Somar.

Estudantes da Escola Estadual Maria Andrade Resende
Estudantes da Escola Estadual Maria Andrade Resende apontam resultados positivos e negativos do projeto (Pablo Nascimento/BHAZ)

Especialistas ouvidos pelo BHAZ também veem possível influência da pandemia, mas acrescentam pontos à discussão. Marcelle Amador, diretora do Sind-UTE (Sindicato Único dos Trabalhadores em Educação de Minas Gerais), questiona a falta de dados públicos sobre o projeto. “Esse contexto é muito delicado. Antes da adoção do Somar, tivemos a pandemia. Qualquer melhora agora significa a volta ao normal do período anterior à pandemia. Esses números são muito discutíveis”, avalia.

Ana Maria Saraiva, professora da Faculdade de Educação da UFMG, pondera que o ensino médio, em geral, tem enfrentado escalada na evasão em função da ampliação das escolas de tempo integral, que seguem diretrizes do governo federal. “Os adolescentes mais pobres trabalhavam no período em que não estavam na escola. Também é comum eles apoiarem em casa, como exemplo, cuidando de um sobrinho ou parente. Como esses jovens precisam trabalhar, acabam abandonando a escola”, afirma, ao destacar a importância de políticas de assistência econômica.

No entanto, as três escolas que integram o Somar atualmente não têm educação de tempo integral. A reportagem visitou a Escola Estadual Maria Andrade Resende na última semana. “Um menino da minha turma já tinha reprovado e largou a escola neste ano. A professora de português tentou resgatá-lo, os professores tentaram conversar, mas ele quis abandonar a escola”, relatou um aluno.

Combate à evasão escolar

A subsecretária de Desenvolvimento da Educação Básica, Kellen Senra, explica que as medidas de combate à evasão e abandono escolar nas unidades do Somar seguem o mesmo padrão de toda a rede estadual.

“Temos um painel estruturado para acompanhar a frequência dos estudantes diariamente. Quando o estudante tem mais de 25% de infrequência, temos que alertar porque a situação pode chegar ao abandono. Então, procuramos entender a dificuldade do estudante para frequentar as aulas. Se isso acontecer por mais de 20 dias consecutivos, acionamos a família e o Conselho Tutelar”, detalha a representante do governo de Minas.

Ampliação do Projeto Somar

A Secretaria de Estado de Educação de Minas Gerais (SEE/MG) publicou, no sábado (14), a lista das Organizações da Sociedade Civil (OSCs) credenciadas para a expansão do Projeto Somar. A iniciativa, que, segundo o governo, visa à gestão compartilhada para a “melhoria da qualidade” do ensino em algumas escolas estaduais, será ampliado em 2025 com a inclusão das novas instituições

Desta vez, a lista terá unidades que trabalham com os anos finais do ensino fundamental e com a Educação de Jovens e Adultos (EJA). “Estamos avaliando o perfil das OSCs para entender a capacidade de atendimento delas. Com base nisso, vamos avaliar como a expansão pode ser feita”, detalhou Kellen Senra.

O projeto Somar foi anunciado pela gestão Zema em meados de 2021 e foi implantado no início de 2022. Na época, a SEE-MG explicou que a escolha das escolas-piloto levou em consideração colégios que apresentavam “indicadores educacionais abaixo da média do estado”.

Para adequação ao novo padrão de gestão, os então funcionários contratados das escolas foram demitidos. Os concursados foram realocados em colégios que não integram o projeto. A instituição responsável pela administração contratou uma nova equipe. Os únicos servidores efetivos do Estado são os diretores, vice-diretores e secretários. Os alunos que já estavam matriculados tiveram direito a continuar nas unidades e, segundo a Secretaria de Educação, os novatos são selecionados pelo próprio sistema de matrículas do Governo Estadual.

Atualmente, as três escolas do Somar contam com 2.010 alunos matriculados. Em 2023, o Governo de Minas pagou à organização aproximadamente R$ R$ 5.293,00 por aluno, chegando a um repasse de aproximadamente R$ 8,6 milhões no ano.

A especialista em educação Ana Maria Saraiva alerta para os riscos de avançar com o modelo no contexto atual. “Ampliar o projeto sem avaliação profunda é um risco. Precisamos de dados, fazer seminários com a comunidade e com a academia para avaliar os resultados. Não tenho visto isso”, destacou.

Questionada sobre os resultados do Somar, a subsecretária de Desenvolvimento da Educação Básica, Kellen Senra, afirmou que as escolas apresentaram avanço no Ideb (Índice de Desenvolvimento da Educação Básica) e no rendimento geral. Em relação ao ganho para o Estado, a representante da pasta afirma que o resultado está ligado às práticas administrativas e ressalta que as instituições contratadas não têm fins lucrativos, o que excluiria a ideia de um modelo mercantilista.

“Eu não diria que o Estado não consegue atender, mas acho que [é uma possibilidade] de fazer uma gestão direcionada administrativamente, porque a gente sabe que, às vezes, dentro de uma grande organização que a gente tem para administrar quase 3.500 escolas, a complexidade das escolas pode nos trazer desafios e questões muito pontuais que podem ser perdidas na visão administrativa”, avalia.

Avaliação dos alunos

Em entrevista ao BHAZ, alunos da Escola Estadual Maria Andrade Resende apontaram acertos e retrocessos na unidade após a implantação do Somar. O ponto mais positivo indicado por eles foi o preparo técnico dos professores. “Eu achei que seria ruim, porque eu não conhecia o modelo, mas eu fui surpreendido. Os professores estão sempre buscando mais conhecimento para nos repassar”, exemplificou Handy Helthas, de 17 anos.

“Os professores são bons e não entram em greve, já que não são pagos diretamente pelo estado”, comentou uma adolescente de 16 anos. A mesma aluna, no entanto, aponta “desorganização” como um ponto negativo.

Em relação à qualidade dos professores, os alunos elogiaram o empenho da administração em trocar a equipe para garantir funcionários empenhados, mas afirmaram que há demora para as substituições. “Tinha um professor específico que faltava muito e ficamos praticamente o ano todo sem aula dele. Ele foi demitido, mas nós estamos sem professor de sociologia há um mês”, relatou uma jovem de 16 anos, aluna do segundo ano.

A reportagem procurou a SEE-MG para comentar sobre a troca do educador citado pela estudante e aguarda retorno. A subsecretária de Desenvolvimento da Educação Básica Kellen Senra disse que desconhece problemas pontuais como este e afirma que o gargalo de contratação já foi superado.

Os relatórios aos quais o BHAZ teve acesso, elaborados neste ano para as três escolas, apontam para a necessidade de “”otimização nos processos de contratação de professores e de disponibilização de informações, inclusive de previsões e de recursos financeiros que facilitem a previsão dos gastos”.

Os documentos também trazem pesquisas de satisfação da comunidade escolar sobre a estrutura de cada uma das unidades. Os resultados variaram de colégio para colégio.

Veja a pesquisa a seguir:

Escola Estadual Maria Andrade Resende

Escola Estadual Francisco Menezes Filho

Escola Estadual Coronel Adelino Castelo Branco

Veja a seguir as metas e resultados para cada uma das escolas do Somar em 2023:

Escola Estadual Maria Andrade Resende

Escola Estadual Francisco Menezes Filho

Escola Estadual Coronel Adelino Castelo Branco

Com edição de Pablo Nogueira

Pablo Nascimento

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