Mariana e outras 22 cidades rejeitam acordo de reparação por rompimento de barragem

07/03/2025 às 18h41
Tragédia de Mariana aconteceu em 2015 (Reprodução/Agência Brasil)

Prefeitos de pelo menos 23 cidades mineiras rejeitaram o acordo de reparação pelos danos do rompimento da Barragem de Fundão, em Mariana, na região Central de Minas Gerais. Os municípios alegam que 4% dos R$ 170 bilhões pagos pela Samarco serão repassados às cidades afetadas, enquanto a maior parte do valor ficará com os governos federal e estadual.

Em coletiva de imprensa, o prefeito de Mariana, Juliano Duarte, explicou as demandas das cidades: “Os municípios não fizeram a adesão principalmente por causa do tempo de pagamento. Demorou nove anos para que o acordo fosse assinado e, depois que o acordo é assinado, os prefeitos vão receber em 20 anos. Então, nós estamos falando de 29 anos para que os prefeitos possam receber de forma integral os valores no Brasil”.

O prazo para adesão do termo, homologado pelo Supremo Tribunal Federal (STF), terminou nesta quinta-feira (6). De acordo com a Samarco, 26 dos 49 municípios aptos a aceitar o acordo de reparação assinaram a proposta.

Já as prefeituras que rejeitaram as cláusulas pretendem renegociar os termos para atender aos interesses das gestões municipais. Para os municípios, “a falta de critério na destinação dos recursos, o impacto gerado nas comunidades desde a tragédia e o pagamento no prazo de 20 anos não é condizente com os prejuízos causados à população”.

“As empresas fizeram o seu papel de depositar valores que quantificam cerca de R$ 170 bilhões para que ocorresse a repactuação. Porém, a grande crítica por parte dos prefeitos foi a forma como esse valor foi dividido: apenas 4% para as 49 cidades onde de fato o impacto aconteceu”, afirmou Duarte.

O prefeito afirmou ainda que os municípios deixam um canal de diálogo aberto junto às mineradoras para a discussão dos termos.

Em nota, o Governo de Minas Gerais disse que “a atual gestão reconhece a legitimidade do posicionamento de cada um dos municípios que integram a bacia do Rio Doce no contexto do desabamento da barragem de Mariana”.

A nota diz ainda que “o novo acordo representa um avanço significativo em relação ao anterior, com debates mais estruturados, projetos mais robustos e um volume maior de recursos” (veja o texto na íntegra abaixo).

Municípios ‘não tiveram voz’

Outro fator apontado pelo executivo de Mariana foi a falta de diálogo com os municípios. De acordo com as prefeituras, as cidades não foram convidadas a participar das discussões a respeito das reparações.

“O impacto fica na cidade, é onde o cidadão procura os seus direitos, procuram as secretarias, procuram os prefeitos, os vereadores. É lá que as pessoas perderam o emprego, é lá que as empresas fecharam as portas em virtude de um crime que foi de responsabilidade de uma empresa. Então nós não entendemos por que os prefeitos não foram convidados para sentar à mesa e participar dessa divisão de valores. Não podemos assinar um acordo onde as cidades não tiveram voz”, completa.

Ação na Inglaterra

As cidades que não assinaram o acordo junto à Samarco agora seguem com ação na justiça da Inglaterra contra a BHP, mineradora sócia majoritária da Samarco.

“Nós temos uma expectativa positiva, que é uma condenação da BHP no meio do ano no tribunal de justiça de Londres. Com essa [possível] condenação, os municípios que não aderiram pleiteiam um valor muito maior. Então eu tenho certeza que os prefeitos que optaram pela ação inglesa vão entender que seguiram o caminho correto”.

“Eu sempre vou defender o município que eu represento. Sempre vou priorizar a ação que mais vier recurso para a minha cidade, porque eu sei as dificuldades que meu município enfrenta”.

Veja cidades que rejeitaram o acordo

Municípios mineiros:

  • Aimorés
  • Alpercata
  • Belo Oriente
  • Bom Jesus do Galho
  • Conselheiro Pena
  • Coronel Fabriciano
  • Galiléia
  • Governador Valadares
  • Ipaba
  • Itueta
  • Mariana
  • Naque 
  • Ouro Preto
  • Periquito 
  • Resplendor
  • São Domingos do Prata
  • São José do Goiabal
  • Tumiritinga

Municípios capixabas:

  • Aracruz
  • Baixo Guandu 
  • Colatina 
  • Marilândia 
  • Sooretama

O que diz a Samarco?

Em nota enviada ao BHAZ (veja na íntegra abaixo), a Samarco informou que está cumprindo integralmente com as obrigações previstas no acordo. “Os recursos que serão repassados aos municípios poderão impulsionar e transformar de forma positiva toda a bacia do Rio Doce. O pagamento da primeira parcela devida aos municípios que aderiram será pago em 30 dias da data de assinatura”, informa o comunicado.

“Os municípios que não aderiram negaram a possibilidade de serem indenizados e, portanto, perderam o direito de acesso aos recursos que poderiam viabilizar investimentos no território por 20 anos para aplicação em políticas públicas necessárias e aderentes à reparação e compensação pelos danos causados pelo rompimento da barragem de Fundão, além de solucionar demandas urgentes dos municípios. A opção pela incerteza de ações judiciais no exterior ainda incertas e longe de serem concluídas prejudica o processo de reparação integral das pessoas e meio ambiente atingidos”, completa o texto.

Ainda conforme a empresa, a adesão ao acordo encerra todas as pendências e ações judiciais entre a Samarco, suas acionistas e partes relacionadas tanto no Brasil quanto no exterior, no âmbito do acordo de reparação.

A empresa também menciona a ação do caso na Inglaterra: “O STF, que ainda decidirá sobre o mérito da legalidade da contratação do escritório estrangeiro, afirmou liminarmente que ‘quaisquer compromissos assumidos, ou mesmo consequências advindas de sentenças estrangeiras, são subordinados aos órgãos de soberania do Brasil’. A decisão deixa claro que os possíveis desdobramentos da ação internacional (vitória ou derrota) estarão sujeitas ao juízo de legalidade das autoridades brasileiras”.

Acordo de Mariana

O Supremo Tribunal Federal (STF) homologou, por unanimidade, o acordo histórico de R$ 170 bilhões para reparar os danos causados pelo rompimento da barragem de Fundão, em Mariana. A decisão foi confirmada com assinatura do presidente do órgão, o ministro Luís Roberto Barroso.

O valor total do acordo será distribuído entre diferentes medidas de compensação e reparação. Dos R$ 170 bilhões, R$ 100 bilhões serão destinados à União, aos estados de Minas Gerais e Espírito Santo e a municípios participantes, para investimentos em projetos ambientais, sociais e econômicos, incluindo programas de transferência de renda. Outros R$ 32 bilhões serão aplicados pela Samarco em ações específicas de recuperação ambiental, como recuperação de áreas degradadas, reassentamento de comunidades e pagamento de indenizações às vítimas. Os R$ 38 bilhões restantes correspondem a ações de reparação já realizadas antes da formalização do acordo.

O acordo também prevê cláusulas exclusivas para pessoas atingidas e para grupos indígenas, quilombolas e tradicionais. Para os afetados diretamente, a adesão ao acordo será opcional, enquanto povos tradicionais serão consultados por meio de um processo especial conduzido pela União. As indenizações individuais serão de R$ 35 mil em média, e pescadores e agricultores terão direito a valores de R$ 95 mil. Para as comunidades indígenas, quilombolas e tradicionais, foram reservados R$ 8 bilhões.

Nota do Governo de Minas Gerais na íntegra

O Governo de Minas, por meio da Secretaria de Estado de Planejamento e Gestão (Seplag), informa que no Novo Acordo de Mariana foram destinados R$ 127 bilhões a serem investidos diretamente na Bacia do Rio Doce. Desse valor, aproximadamente R$ 25 bilhões estão previstos para serem aplicados pelo Estado de Minas Gerais na execução de políticas públicas de reparação e compensação dos danos causados pelo desastre, sendo 96% desse recurso direcionado exclusivamente para o território atingido. O valor total de investimento no território mineiro, incluindo o montante a ser executado por outras partes do Acordo, como a União e as empresas, perfazem o montante de R$ 81 bilhões. A execução dos recursos tem fiscalização do Tribunal de Contas do Estado de Minas Gerais (TCE-MG) e de demais mecanismos de controle da administração pública, além do acompanhamento pelo Judiciário, via TRF-6.

Os recursos executados pelo Estado são destinados principalmente a ações de reparação ambiental, saneamento, saúde, recuperação produtiva das propriedades da calha do rio e desenvolvimento econômico, não podendo ser utilizados indiscriminadamente, como, por exemplo, em gastos como folha de pagamento.

Reforçamos que a atual gestão reconhece a legitimidade do posicionamento de cada um dos municípios que integram a bacia do Rio Doce no contexto do desabamento da barragem de Mariana, uma vez que foram os munícipes dessas localidades os mais diretamente impactados pela tragédia.

Desde o início das negociações, os esforços do Governo de Minas, das Instituições de Justiça e dos Órgãos de Controle sempre tiveram como prioridade a reparação ambiental, a reconstrução das bases econômicas, produtivas e sociais da região e a retomada do protagonismo do Rio Doce no estado. Os municípios afetados estiveram presentes nesse processo, representados pelo Fórum de Prefeitos do Rio Doce, contribuindo com suas perspectivas e necessidades ao longo das discussões.

O novo acordo representa um avanço significativo em relação ao anterior, com debates mais estruturados, projetos mais robustos e um volume maior de recursos. No entanto, considerando a dimensão dos danos econômicos, das vidas perdidas e da catástrofe ambiental provocada pelo desastre, o Governo de Minas reforça que ainda há muito a ser feito para garantir a plena recuperação da região. Seguiremos empenhados para que as ações de reparação avancem com responsabilidade, transparência e efetividade.

Isabella Guasti

Jornalista graduada pela UFMG (Universidade Federal de Minas Gerais) e repórter do BHAZ desde 2021. Participou de reportagem premiada pela CDL/BH em 2022 e também de reportagem premiada pelo Sebrae Minas em 2023. Vencedora do prêmio CDL/BH de jornalismo 2024.

Isabella Guasti

Email: [email protected]

Jornalista graduada pela UFMG (Universidade Federal de Minas Gerais) e repórter do BHAZ desde 2021. Participou de reportagem premiada pela CDL/BH em 2022 e também de reportagem premiada pelo Sebrae Minas em 2023. Vencedora do prêmio CDL/BH de jornalismo 2024.

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