Vereador mineiro tenta entrar em sala de aula após denúncia de ensino de ‘ideologia de gênero’

vereador José Luiz Borges Júnior chama PM Escola Municipal Norma Borges Beluco
Vereador acionou a Polícia Militar (Reprodução/@joseluiz.borgesjunior/Facebook)

O vereador bolsonarista José Luiz Borges Júnior (Podemos), de Patos de Minas, no Alto Paranaíba, tentou entrar em uma sala de aula na Escola Municipal Norma Borges Beluco, ontem (19), com a alegação de ter recebido uma denúncia de ensino de “ideologia de gênero”. O diretor da escola, Jefferson Vieira Lima, contou ao BHAZ que ele recebeu autorização para entrar na aula – até o momento que começou a ofender o professor. O vereador chegou a acionar a Polícia Militar.

De acordo com José Luiz, o pai de um aluno disse a ele que um professor do nono ano do ensino fundamental estava ensinado “ideologia de gênero” aos alunos. Diante da denúncia, o vereador se deslocou, ontem (19), até a escola “para verificar se o professor estaria falando sobre orientação sexual”, segundo o próprio político. José Luiz ainda disse que o pai informou a ele que “outras ideologias” também estavam sendo exaltadas dentro da sala de aula.

“Pedimos ao diretor da escola para que adentrássemos, para a gente procurar saber, averiguar essas informações, para saber se procediam ou não, e eles nos impediu”, alegou o vereador em um vídeo nas redes sociais. “Nesse impedimento, solicitamos a vinda da Polícia Militar, fizemos um BO, e já registramos, e agora vamos para frente tomar as medidas cabíveis”, continuou.

O parlamentar disse que o professor também estava presente na conversa e o convidou a entrar na sala de aula, mas o diretor impediu o acesso. Ainda segundo José Luiz, o próprio professor confirmou “o que estava sendo feito”. O diretor da escola, a Secretaria Municipal da Educação (Semed) e a Polícia Militar, contudo, apresentam outra versão dos acontecimentos.

Versão dos demais envolvidos

O diretor da escola, Jefferson Vieira Lima, explicou ao BHAZ que o vereador não foi impedido de entrar no local e inclusive conversou com ele no próprio escritório. Ao conversarem dentro da escola, o parlamentar trouxe a denúncia do pai e também chegou a questionar os protocolos sanitários que a instituição continua adotando no ambiente escolar.

“O assessor [do vereador] perguntou qual era o meu posicionamento e eu disse pra ele que a nossa escola não acredita em ideologia de gênero e sim em identidade de gênero – há previsão disso na base curricular ao tratar de afetividade e sexualidade”, explicou.

“Expliquei isso para ele e falei que mesmo não existindo ideologia de gênero, há pessoas que acreditam, mas que o tratamento da escola, o grande objetivo, é trabalhar a dimensão da inclusão de todo e qualquer ser humano”, completou.

Segundo o diretor, o vereador disse que queria ir para a sala de aula “investigar” a situação. “Eu disse que não era possível sem o consentimento do professor”, relatou. O professor, então, dirigiu-se ao gabinete, autorizou a ida do vereador e explicou sobre o currículo da matéria.

De acordo com a Secretária Municipal de Educação, o educador disse ao parlamentar que o conteúdo se tratava do sistema reprodutor masculino e feminino, ensinamento padrão para o nono ano do ensino fundamental.

Jefferson relata que, após a autorização, o vereador começou a levantar questionamentos do objetivo e intenção do professor ao trabalhar o assunto. “Nesse momento ele começou a ofender o professor”, disse. “Aí o professor disse a ele: ‘como o senhor já definiu que eu estou errado, já tem o seu juízo, então assistir a aula não vai ajudar o senhor’ e falou que ele poderia acionar a secretaria municipal que a gente passaria o plano com respaldo da BNCC'”.

PM confirma versão do diretor

A Polícia Militar foi acionada no momento que o diretor disse ao vereador que o acesso à sala de aula precisaria de autorização do professor – e os policias acompanharam os desdobramentos do caso. No registro policial consta que o parlamentar queria assistir a aula ministrada aos alunos – o que foi autorizado pela escola. Ainda segundo a PM, o diretor disse que a decisão ficaria a critério do professor – que autorizou a presença do vereador na aula.

O diretor reforçou que as famílias podem procurar a escola no caso de dúvidas sobre o currículo escolar – o que não aconteceu neste caso. “Nós nos prontificamos – que a escola estava à disposição dele [do vereador], da família, para uma conversa mais ampla, inclusive explicar na Câmara [dos Vereadores] sobre como funciona nossos trabalhos, qual a justificativa legal para como nós trabalhamos”, disse Jefferson.

Jefferson ainda observou que o vereador poderia ter assistido as aulas virtualmente. “Nossas aulas são todas transmitidas, se ele quisesse realmente assistir ele poderia ou ir para a casa do denunciante ou ter acessado o link ou nos solicitado. Para a gente, houve mais uma questão de levantar uma bandeira ideológica e fazer propaganda da vertente dele e eu disse que nossa escola não faz respaldo disso”, finalizou.

Ensino segue diretrizes nacionais

A escola informou, tanto no boletim de ocorrência, quanto no posicionamento enviado ao BHAZ, que segue a Base Nacional Comum Curricular. “A habilidade trabalhada, estando ela no BNCC, é ‘Vida e evolução: mecanismos reprodutivos/sexualidade’, por meio da qual o professor é orientado a selecionar argumentos que evidenciem as múltiplas dimensões da sexualidade humana (biológica, sociocultural, afetiva e ética)”, pontuam.

A Secretaria Municipal de Educação ainda lembra que durante a abordagem de qualquer conteúdo em sala de aula, é natural que os estudantes levantem questionamentos baseados nos conhecimentos que já têm. “E o professor, obviamente, esclarece cumprindo o seu papel dentro da sala de aula”, complementam.

A instituição ainda ressalta que temas relacionados à reprodução e à sexualidade humana, abordados nos anos finais, são assuntos de grande interesse e relevância social nessa faixa etária. “Assim como são relevantes também o conhecimento das condições de saúde, do saneamento básico, da qualidade do ar e das condições nutricionais da população brasileira”, reforçam.

Por fim, a Semed disse que, em caso de dúvidas e questionamentos, os pais têm total liberdade de procurar a direção das escolas ou diretamente a secretaria.

Nas redes sociais, o vereador disse que vai continuar lutando contra a “ideologia de gênero”. “Isso nós não vamos permitir. Enquanto eu for vereador desta cidade eu não vou permitir que isso seja implantado na nossa escola”, finalizou.

Nota da Secretaria Municipal de Educação na íntegra

“Sobre o vídeo divulgado pelo vereador José Luiz Borges Júnior, a Secretaria Municipal de Educação esclarece que:

  • o vereador chegou na escola no horário de aula do professor, sendo então informado pelo diretor que só poderia adentrar a sala com a permissão do educador;
  • o professor foi chamado e, em conversa com o vereador, explicou que o conteúdo ministrado trata do sistema reprodutor masculino e feminino, ensinamento padrão para o nono ano do ensino fundamental; portanto não foi abordada ideologia de gênero;
  • mediante discurso alterado do vereador e do seu assessor, o diretor esclareceu que não autorizaria a entrada do vereador em sala de aula para discursar contra ou a favor de nenhum tema;
  • durante a abordagem de qualquer conteúdo em sala de aula, é natural que os estudantes levantem questionamentos baseados nos conhecimentos que já têm; o professor, obviamente, esclarece cumprindo o seu papel dentro da sala de aula;
  • vale lembrar que o ensino em todo o país segue a Base Nacional Comum Curricular, e não é diferente em Patos de Minas. A habilidade trabalhada, estando ela no BNCC, é “Vida e evolução: mecanismos reprodutivos/sexualidade”, por meio da qual o professor é orientado a selecionar argumentos que evidenciem as múltiplas dimensões da sexualidade humana (biológica, sociocultural, afetiva e ética);
  • ainda cumpre ressaltar que temas relacionados à reprodução e à sexualidade humana, abordados nos anos finais, são assuntos de grande interesse e relevância social nessa faixa etária, assim como são relevantes também o conhecimento das condições de saúde, do saneamento básico, da qualidade do ar e das condições nutricionais da população brasileira;
  • a Semed orienta que, em caso de dúvidas e questionamentos, os pais têm total liberdade de procurar a direção das escolas ou diretamente a secretaria”.
Edição: Roberth Costa

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