Galoucura afirma que não banirá cantos homofóbicos em jogos: ‘Coisa mínima’

Torcida Organizada Galoucura/Facebook/Reprodução

Após torcedores do Cruzeiro entoarem um canto homofóbico no jogo contra o Vasco, no Mineirão, na noite desse domingo (1º), o BHAZ fez contato com as torcidas organizadas, times e especialistas para debater a questão. Mesmo com o clube podendo sofrer sanções pelo Superior Tribunal de Justiça Desportiva (STJD), a Galoucura afirma que os cantos homofóbicos vão continuar. A Máfia Azul, responsável pelo canto desse domingo, não quis se manifestar sobre o assunto.

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No jogo desse domingo, o canto foi entoado após o Mineirão avisar, no sistema de som, sobre um gol sofrido pelo Atlético. Com isso, foi entoado: “Cachorrada filha da pu**, chupa ro** e dá o c*. Ei, Galo, vai tomar no c*! Ei, Galo, vai tomar no c*! Sou eu, sou eu, sou eu da Máfia Azul sou eu, até morrer!”.

O árbitro Marcelo Aparecido, substituto de Héber Roberto Lopes, que passou mal antes da partida começar, deixou o jogo seguir após o canto. O juiz também ignorou o fato na súmula, contrariando orientação do STJD (relembre aqui).

A Máfia Azul disse que não irá se pronunciar sobre o assunto. Por telefone, os responsáveis informaram que a torcida organizada não tem nenhum projeto para combate a homofobia nos estádios.

‘Acabando com o futebol’

A Galoucura, principal torcida do Atlético, também é responsável por entoar cantos homofóbicos durante jogos. Em entrevista ao BHAZ, Josimar Júnior de Souza Barros, presidente da Torcida Organizada Galoucura, disse que a proibição dos cantos homofóbicos está “acabando com o espetáculo do futebol”.

“Nossos cantos não citam o nome de ninguém, é uma coisa que vem de muitos anos atrás. Já proíbe bandeira, sinalizador, o que tem em todos os outros países, só aqui que é assim”, relata.

“Agora estão querendo acabar com algo que, querendo ou não, já faz parte do clássico. Isso não ofende ninguém. A gente não está falando especificamente com o torcedor. Isso só está acabando com o futebol, cada vez mais. Está começando o futebol moderno, e nós não apoiamos”, diz o presidente da Galoucura.

De acordo com ele, o objetivo é sempre torcer e apoiar o Galo em qualquer situação. “Estão dando um peso maior para uma coisa mínima. Se tiver [o canto homofóbico] ou não, para a gente não faz diferença nenhuma. Sempre acontece [o canto homofóbico] e para nós não vai mudar em nada. Os cantos vão continuar como sempre foram, não vamos parar. Se nós tivermos que ir lá, cantar e chamar eles de Maria, vamos chamar”, completa.

Masculinidade frágil

De acordo com Silvio Ricardo da Silva, professor de Educação Física da UFMG e coordenador do Grupo de Estudos sobre Futebol e Torcidas (GEFuT), o futebol, de uma maneira geral, “está muito ligado a uma lógica de masculinidade”.

“Tudo que for contrário a isso, torna-se algo frágil. Um esporte criado por homens brancos, ricos. Então, temos um reflexo desse conjunto que acaba representando a sociedade. Ainda bem que temos alguns sinais de certa consciência sobre isso, seja do ponto de vista educativo ou punitivo. Vislumbro tempos melhores para o que se refere à prática do futebol”, explica.

“Na medida que esse esporte é tido como algo hegemonicamente masculino, criado por homens para homens, aquilo que sai dessa heteronormatividade, é algo indesejado. Como a questão da sexualidade vem sendo tão discutida na sociedade, isso também vai chegando no esporte”, explica o professor.

“Já vivemos outros absurdos, como a prática do futebol feito por negros e mulheres, que era algo proibido. Tudo isso tende a melhorar, mas a resistência ainda é grande, em função de vivermos em uma sociedade homofóbica, racista, preconceituosa de uma forma geral. E, para piorar, ainda vivemos tempos de um conservadorismo extremo”, pondera o coordenador do GEFuT.

Punição

De acordo com o especialista, é fundamental o clube ser punido quando esse tipo de ato acontecer. “É isso que traz a diferença. A partir da possibilidade da punição, como também é com a questão do racismo há algum tempo, é que os próprios torcedores vão se policiar. Antigamente, quando eu frequentava o estádio na minha adolescência, nós atirávamos objetos no campo. Por que não faz mais isso? Em função da possibilidade de punição. Por isso, é importantíssimo”, completa.

Vale lembrar que orientação do STJD ocorreu após o STF (Supremo Tribunal Federal) criminalizar a homofobia em junho. Portanto, gritos homofóbicos podem não apenas prejudicar o clube – até com perda de ponto -, como, principalmente, é crime:

  • “praticar, induzir ou incitar a discriminação ou preconceito” em razão da orientação sexual da pessoa poderá ser considerado crime;
  • a pena será de um a três anos, além de multa;
  • se houver divulgação ampla de ato homofóbico em meios de comunicação, como publicação em rede social, a pena será de dois a cinco anos, além de multa;
  • a aplicação da pena de racismo valerá até o Congresso Nacional aprovar uma lei sobre o tema.

+ Agora é crime! STF criminaliza homofobia e transfobia

Por nota (leia abaixo na íntegra), o Cruzeiro disse que está “trabalhando no sentido de reeducar nosso torcedor em relação ao assunto, que é de suma importância”. O clube também lembrou que está em uma campanha, junto com todos os times da Série A, contra a homofobia no futebol. O time azul também reforça que sabem que “uma campanha que não traz uma eficácia imediata, uma vez que os clubes não são os aplicadores da lei”.

De acordo com o Atlético, o clube já vinha fazendo campanhas contra a homofobia através de suas redes sociais. “O Clube Atlético Mineiro é um time de todos, que abrange todas as camadas sociais, e não permite nenhum tipo de preconceito. Durante os jogos, avisos nos telões e no sistema de som alertam o torcedor quanto à prática. Além da questão da punição por sanções, é válido lembrar que homofobia é crime, uma prática condenável, que não tem mais espaço na sociedade”.

Nota do Cruzeiro

“Quem vem acompanhando nossas redes sociais desde sexta-feira pode perceber que participamos de uma campanha junto com os demais clubes da Série A, abordando a conscientização sobre homofobia nos estádios de futebol.

Conforme solicitação do STJD, estamos trabalhando no sentido de reeducar nosso torcedor em relação ao assunto, que é de suma importância.

Por outro lado, sabemos que se trata de uma campanha que não traz uma eficácia imediata, uma vez que os clubes não são os aplicadores da lei”.

Vitor Fernandes[email protected]

Sub-editor, no BHAZ desde fevereiro de 2017. Jornalista graduado pela PUC Minas, com experiência em redações de veículos de comunicação. Trabalhou na gestão de redes do interior da Rede Minas e na parte esportiva do Portal UOL. Com reportagens vencedoras nos prêmios CDL (2018, 2019, 2020 e 2022), Sindibel (2019), Sebrae (2021) e Claudio Weber Abramo de Jornalismo de Dados (2021).

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