Motorista não reagiu e foi morto com ‘requintes de crueldade’, diz PM

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Motorista Anderson foi encontrado morto e carro abandonado (Reprodução/Facebook)

A revoltante morte do motorista de aplicativo de 27 anos, abordado por criminosos enquanto trabalhava na Virada do Ano, ainda gera comoção e inconformismo – e reacende o debate sobre a insegurança desse tipo de trabalhador. Anderson Coelho Alves desapareceu na última quinta (31), grande mobilização foi formada para encontrá-lo, mas o desfecho foi o pior possível: a polícia encontrou o jovem morto.

Motivada pela morte de Anderson, a Frente de Apoio Nacional dos Motoristas Autônomos (Fanma) marcou um protesto para terça-feira (5). “Chega de perdermos nossos parceiros para vagabundos! Queremos voltar pras nossas famílias!”, diz o movimento. Os trabalhadores pretendem se reunir na Praça do Papa às 10h e seguir em direção à Cidade Administrativa, sede do Governo de Minas.

O assassinato de Anderson gera ainda mais revolta pelos traços de crueldade, como a própria Polícia Militar define. Os dois homens presos que confessaram o crime admitiram aos militares que o trabalhador não esboçou reação em qualquer momento. A dupla abordou Anderson no bairro Nova York, na região de Venda Nova, roubaram os pertences do motorista e o levaram para uma estrada de terra.

Lá, realizaram uma sessão de tortura, com direito a braços e pernas amarrados, tentativa de degola e outros “requintes de crueldade”. Tudo isso, admitem os criminosos, sem Anderson esboçar qualquer reação. “Nunca esperava achar ele sem vida. Tinha esperança de encontrar ele amarrado em algum lugar”, disse Alisson Alves, irmão de Anderson, ao G1.

Insegurança

“Não vamos mais permitir que mortes como a de nosso colega sejam em vão. A mudança começa pela nossa união: ‘Juntos somos mais fortes'”, reforça o texto divulgado pela Fanma. Em entrevista ao BHAZ, o presidente da frente, Paulo Xavier, fez duras críticas às plataformas, responsáveis por escolher os passageiros. “Do motorista é exigido muitas coisas, foto, antecedentes criminais, e do passageiro não, o passageiro não tem nenhuma foto, a gente não tem nenhuma informação sobre ele”, diz.

A solução que o presidente da Fanma busca, junto aos integrantes da associação, é uma seleção rígida das plataformas no momento de cadastrar os usuários. “O usuário, quando pede o carro ele tem a foto [do motorista], tem total segurança, e para os motoristas tem segurança zero”. Paulo Xavier também acredita que a tipificação do crime contra motoristas de aplicativo seja uma benéfico. De acordo com o motorista, as estatísticas ajudam “para que aconteça uma preventiva maior com relação a isso, à segurança”.

Paulo Xavier, que também é motorista, chama a atenção ainda para a questão da segurança pública. “A gente sai para trabalhar e pega esse tipo de meliante, e no caminho não encontra nenhuma viatura, nenhuma abordagem. A gente sempre tentou junto da segurança pública ter uma espécie de blitz ou de operação voltada para os motoristas de aplicativo, e não tem. O crime contra o motorista de aplicativo não é nem tipificado pela Polícia Militar”.

Além da falta de segurança em relação aos passageiros, Paulo Xavier também aponta a dificuldade para encontrar um carro que tenha desaparecido. “Quando a gente busca na plataforma uma informação, por exemplo, de onde o carro foi parado, até para ajudar a polícia nas investigações, as plataformas têm dificuldade de dar esse tipo de retorno”. Para ele, esse é um dos pontos necessários a serem melhorados.

Revolta

Além de questionamentos sobre as condições de trabalho, os motoristas se queixam sobre a insegurança durante a atividade. “Também rodo em app, é um leão a cada dia. Temos horário de sair, mas voltar somente Deus sabe”, publicou Leonardo Barbosa nos comentários da reportagem sobre a morte de Anderson. “Fico pensando todos os dias em minha família, pedindo a Deus que eu possa vê-la novamente. Que o senhor possa consolar os corações dos familiares [de Anderson]”, complementou.

Leitores do BHAZ manifestam indignação nas redes (Reprodução/Facebook)

A angústia descrita por Leonardo também é sentida pelos familiares desses trabalhadores: “Que tristeza! Tenho um filho que trabalho com aplicativo, já foi assaltado também. Enquanto ele não chega em casa, a gente não descansa a cabeça”, publicou Roselania Duarte Campos.

Familiares também mostram angústia (Reprodução/Facebook)

Aplicativos

Por meio de notas enviadas ao BHAZ (veja na íntegra abaixo), a Uber e a 99 Pop explicam que a segurança é a prioridade de seus negócios. A primeira cita novas ferramentas tecnológicas, como a checagem de documentos de usuários, enquanto a segunda diz ter investido R$ 35 milhões, no ano passado, em ferramentas e sistemas preventivos de proteção.

Nota da 99 Pop na íntegra

Segurança é uma prioridade para a 99.  Em 2020, o aplicativo investiu mais de R$ 35 milhões em ferramentas e sistemas preventivos de proteção. O resultado foi a redução de 8% das ocorrências graves registradas na plataforma por milhão de corridas, de janeiro a setembro, em Minas Gerais. 

A 99 também lançou a expansão nacional das câmeras de segurança, sendo o único app do setor a oferecer esse serviço. Belo Horizonte foi uma das primeiras cidades a receber o dispositivo ainda em 2019. Do começo ao fim de todas as corridas do app, a câmera registra imagens e, no momento em que o motorista aciona o botão de segurança que acompanha o dispositivo, a Central de Segurança da 99 é avisada e o monitoramento da corrida em tempo real começa. As imagens captadas também podem ser usadas para ajudar as autoridades na identificação de pessoas que cometerem eventuais infrações. Se necessário, a polícia é contatada.

Além disso, como formas de prevenção antes das chamadas, a companhia mostra aos motoristas informações sobre o destino final, a nota do passageiro e se ele é frequente – além de exigir que todos os passageiros incluam CPF ou cartão de crédito. Durante o trajeto, ferramentas como, gravação de áudio, monitoramento da corrida via GPS, compartilhamento de rotas com parentes e amigos e um botão para ligar direto para a polícia estão disponíveis. Depois das viagens, existe um recurso que permite bloquear o passageiro caso o motorista não queira se conectar com ele novamente em viagens futuras. Em caso de emergência contra os motoristas parceiros, uma central telefônica funciona 24h e oferece apoio imediato no 0800-888-8999″.

Nota da Uber na íntegra

Segurança é prioridade para a Uber e a empresa está sempre buscando, por meio da tecnologia, fazer da sua plataforma a mais segura possível, de uma forma escalável. Foi anunciada recentemente a introdução da checagem de documentos de usuários – algo inédito nas alternativas de mobilidade urbana. Com isso, usuários que optarem por pagar sua primeira viagem em dinheiro, sem fornecer dados do meio de pagamento digital (cartão de crédito ou débito), precisarão fornecer um documento de identidade, como RG ou CNH. A tecnologia já é utilizada pela Uber em países como Chile, México e Argentina.

A medida vem se somar ao que o aplicativo já exige hoje do usuário que quiser pagar somente em dinheiro: que insira o CPF e data de nascimento, dados que são checados na base de dados do Serasa. A ferramenta que faz essa verificação, denominada U-Check, foi anunciada em 2019, como primeiro projeto entregue pelo Centro de Desenvolvimento Tecnológico instalado pela Uber em São Paulo – o primeiro do gênero instalado pela empresa na América Latina, com foco em segurança. 

A informação sobre essa opção de pagamento também é exibida na tela do aplicativo de quem está atrás do volante antes que o usuário entre no carro, assim como a região do destino final e a nota do usuário no aplicativo. 

Além disso, a Uber utiliza no Brasil o recurso de machine learning. Esta ferramenta usa algoritmos que aprendem de forma automatizada a partir dos dados históricos de viagem e bloqueia aquelas consideradas potencialmente mais arriscadas, a menos que o usuário forneça detalhes adicionais de identificação.

O aplicativo da Uber permite ainda que solicitações de viagens sejam canceladas por motoristas parceiros sinalizando motivo de segurança sempre que não se sentirem confortáveis.

Além dos recursos já mencionados para segurança do motorista antes mesmo dele pegar o usuário, hoje uma viagem pelo aplicativo já inclui outras ferramentas de segurança durante e depois de cada viagem, tanto para os usuários quanto para os motoristas parceiros. 

Durante

Caso aconteça uma parada longa e não prevista na rota ou se a viagem terminar fora do destino planejado, a Uber pode iniciar uma checagem e enviar uma mensagem para o motorista parceiro e o usuário perguntando se é necessário algum suporte e direcionando-o às ferramentas de segurança. 

Desde 2018, tanto o aplicativo do usuário quanto dos motoristas parceiros foram atualizados com o lançamento do botão Recursos de Segurança, que reúne todas as funções de segurança da plataforma. Assim, ao longo do trajeto, usuários e motoristas parceiros podem compartilhar a sua localização e o tempo de chegada em tempo real com quem desejarem. O recurso também oferece a opção de ligar para a polícia em situações de risco ou emergência diretamente do app. 

Por meio desse botão também possível acionar o recurso de gravação de áudio. Tanto o usuário quanto o motorista parceiro, têm a opção de relatar um incidente de segurança e anexar o arquivo de gravação de áudio. O áudio permanece criptografado e armazenado diretamente no dispositivo de quem fez a gravação. A Uber só poderá acessá-lo se for compartilhado como parte do relato. 

Depois

Usuários e motoristas podem e devem avaliar um ao outro depois de cada viagem, de forma anônima. Uma equipe monitora essas informações e pode banir da plataforma usuários ou motoristas que tiverem uma média baixa de avaliações ou conduta que viole os termos e condições de uso ou o código de conduta da comunidade, como por exemplo, comportamento inapropriado ou perigoso. 

Os motoristas parceiros contam ainda com um número de telefone 0800 para registrar casos de emergência e solicitar apoio da Uber depois que tiverem comunicado às autoridades e estiverem em segurança. O time de suporte está disponível 24 horas por dia, sete dias por semana pelo aplicativo e analisa caso a caso cada registro”.

Edição: Thiago Ricci
Jordânia Andrade[email protected]

Repórter do BHAZ desde outubro de 2020. Jornalista formada no UniBH (Centro Universitário de Belo Horizonte) com passagens pelos veículos Sou BH, Alvorada FM e rádio Itatiaia. Atua em projetos com foco em política, diversidade e jornalismo comunitário.

Andreza Miranda[email protected]

Graduada em Jornalismo pela UFMG (Universidade Federal de Minas Gerais) e repórter do BHAZ desde 2020. Participou de duas reportagens premiadas pela CDL/BH (2021 e 2022); de reportagem do projeto MonitorA, vencedor do Prêmio Cláudio Weber Abramo (2021); e de duas reportagens premiadas pelo Sebrae Minas (2021 e 2023).

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