Metaleiros de BH relembram início do Sepultura: ‘Mostrou que é possível’

Guitarrista acha que banda perdeu a mineiridade ao longo dos anos, mas se orgulha do início da trajetória (Reprodução/Redes Sociais)

Às vésperas do primeiro show da turnê de despedida do Sepultura, o ex-guitarrista do grupo, Jairo Guedz, relembra, com gratidão, o início da trajetória da banda. Para ele, o status alcançado pelos “camisas pretas” foi construído a muitas mãos ao longo das últimas quatro décadas de atividade.

De trajetória inquestionável, a banda belo-horizontina de heavy metal cravou, ainda na década de 1980, a música com toque brasileiro no mapa-múndi do rock. Filho do Santa Tereza, o Sepultura não só exportou seu som para países de todo o globo, mas se consolidou como precursor de uma vertente ainda mais pesada do metal, o black metal.

Antes de se tornar um produto mundial, entretanto, a banda contou com o apoio de grandes figuras locais, como João Eduardo Faria e Pat Pereira, proprietários da Cogumelo Records. Foi pela gravadora que o Sepultura lançou seus três primeiros trabalhos, o EP Bestial Devastation (1985) e os discos completos Morbid Visions (1986) e Schizophrenia (1987).

“Eu diria que o João foi até mais corajoso do que a gente como banda, porque ele investiu. Foi ele, pela Cogumelo, que deu o aval e assumiu a coisa. ‘Sou eu quem represento essa banda aqui. Eu que tô botando no mercado'”, conta Guedz, sobre o protagonismo do selo mineiro nos primeiros anos de carreira do Sepultura. “Naquela época, todo mundo queria ter um trabalho gravado, e a Cogumelo fez isso pela gente”.

Alcance

Após o lançamento de Schizophrenia (1987), o som do Sepultura chamou a atenção da gravadora americana Roadrunner Records, que não demorou a firmar um contrato com os jovens roqueiros mineiros. João conta que a ruptura da banda com a Cogumelo ocorreu de forma tranquila.

“Eu disse pro Max (Cavalera, fundador e então vocalista): ‘pode fechar esse contrato, eu vou dar a maior força pra vocês’. E foi o que os diferenciou, porque a Roadrunner percebeu o potencial deles, gravou o Beneath the Remains (1987). O resto é história”, relembra o João Eduardo.

A essa altura, Jairo Guedz já não fazia mais parte do Sepultura, mas acredita que os ex-companheiros de banda ainda não tinham dimensão do tamanho que tinham tomado. “Eu acho que o artista nunca sabe que chegou lá. Nem o Elon Musk deve achar que chegou em algum lugar, ou no lugar que ele imaginou quando criança”, brinca.

O auge

Mas o melhor ainda estava por vir. Em 1996, também pela Roadrunner, o Sepultura lançou aquela que é tida como sua obra-prima: o disco Roots. De caráter extensivamente experimental, o disco traz participações de Carlinhos Brown, arranjador e percussionista baiano, e indígenas dos povos xavante, jasco e itsari, do Mato Grosso.

Para o jornalista e crítico musical Terence Machado, a comparação entre Sepultura e certos títulos de renome na mídia era injusta, porque, surpreendentemente, a banda belo-horizontina se saía melhor que eles.

“Eu vi o Megadeth em uma turnê em Belo Horizonte e achei um ‘estalinho’ perto do Sepultura. Me soou como uma banda colegial. Se o Sepultura era uma bomba atômica, o Megadeth era um ‘estalinho’ de festa junina”, brinca.

Naturalmente, o sucesso estrondoso de Roots escancarou a janela de comparações entre formações, novos e ex-integrantes da banda. Para Guedz, no entanto, o então sucesso do Sepultura tinha raízes muito mais profundas.

“As pessoas sempre falam comigo: ‘o disco tal é melhor, bom é esse e não aquele’ ou falam ‘Sepultura pra mim é com o Max, Sepultura é o do Roots’. Galera, eu não quero puxar ‘sardinha’ pro meu lado, mas nada disso aconteceria se não fossem os primeiros álbuns. E esses álbuns envolvem um monte de coisas! São as nossas mães, os nossos pais, que nos apoiaram, e muitos outros”, pontua.

Identidade

Fato é que, a muitas mãos, o Sepultura cresceu. Muito. E não só: também deu visibilidade para conterrâneos, que inspirados pelos feitos dos mineiros, se lançaram no mesmo caminho. Foi o caso da Eminence, banda belo-horizontina de black metal, que saiu do unerground brasileiro para ganhar os palcos dos maiores festivais internacionais de música.

“Quando o Sepultura saiu do Brasil e fez sucesso no mundo todo, a gente pensou: ‘é possível, né? É possível sair daqui e tocar em outros lugares”, revela Alan Wallace, guitarrista do Eminence. “O Sepultura é uma das maiores bandas de metal do mundo, e também fonte de inspiração pra todos nós”.

Atualmente, o baixista Paulo Xisto segue como o elo remanescente da formação original do Sepultura na atual. Dos quatro mineiros fundadores, apenas ele defende a bandeira de Minas Gerais num grupo que já se tornou global. Além de Andreas Kisser, paulista, e Derrick Green, americano, o grupo conta com o recém-chegado Greyson Nekrutman, também estadunidense, que assume as baquetas deixadas por Eloy Casagrande.

Mas será que a banda perdeu sua identidade? Alan Wallace afirma que não. “O Sepultura é quase uma entidade. Existem as ‘viúvas’ do Max, do Igor, mas a química segue com o Andreas, o Derrick e o Paulo”.

Terence Machado também continua se surpreendendo com a potência do título. “Eu acho impressionante o Sepultura como marca. E foi legal ver eles se reinventarem a ponto de continuarem sendo uma banda bombástica”, diz.

Jairo Guedz vai na contramão, acha que o jeitinho mineiro talvez tenha ficado lá atrás. “Se eu e o Paulo estivéssemos na banda juntos até hoje, com certeza a banda estaria comendo mais pão de queijo do que come”, brinca.

Thiago Cândido[email protected]

Estudante de Jornalismo na Universidade Federal de Minas Gerais. Colunista no programa Agenda da Rede Minas de Televisão. Estagiário do BHAZ desde setembro de 2023.

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