Escolas da rede municipal de Belo Horizonte terão que arcar com a compra do kits escolares entregues todos os anos aos alunos, diferente do que ocorre tradicionalmente, em que são fornecidos com recursos da Secretaria Municipal de Educação. O problema se agrava porque, de acordo com a categoria que representa os professores, somente na última sexta-feira (31), menos de uma semana para o início das aulas, as escolas foram notificadas sobre a alteração, em meio a uma mudança de diretores, e não tiveram tempo para compras. Com isso, pais e professores temem pelos prejuízos da decisão. Ao BHAZ, a PBH confirmou a determinação e garantiu que não haverá impacto no processo de aprendizagem das crianças.
De acordo com o Sindicato dos Trabalhadores em Educação da Rede Pública Municipal de Belo Horizonte, os kits, que incluem cadernos, lápis, borrachas, canetas e outros materiais essenciais disponibilizados, sobretudo para alunos de familias vulneráveis, vão precisar ser comprados diretamente pelas instituições, por meio das caixas escolares. No entanto, muitas delas não sabem como viabilizar a compra, o que poderá atrasar a entrega aos estudantes.
Veja também
Vanessa Portugal, da Diretoria Colegiada do Sind-Rede/BH, explica que as caixas escolares são estruturas jurídicas vinculadas às escolas, responsáveis por receber os recursos destinados às despesas educacionais. Cada unidade conta com sua própria caixa, presidida pelo diretor ou diretora da instituição. “Em conversa com a secretaria, nos foi informado que boa parte das caixas escolares teria recursos suficientes para a compra dos kits. Porém, o valor disponível não é uniforme em todas as escolas, devido a diversos fatores. Ou seja, embora tenha feito o comunicado, não houve definição, liberação ou provisionamento da verba”, explica.
A representante do Sind-Rede/BH ainda afirma que, mesmo que algumas instituições tenha dinheiro nas caixas escolares, isso não significa haver recursos ‘sobrando’. “Essa quantia pode estar provisionada para outros pagamentos, como salário dos trabalhadores da integrada, obras ou outros procedimentos em curso. Essa é uma situação que cada caso deve ser considerado”, conta.
Além disso, Vanessa destaca que qualquer nova despesa para as escolas deve ser acompanhada de uma previsão orçamentária clara e publicada. “O período letivo estava programado para começar na segunda-feira, 3 de fevereiro, embora os alunos tenham sido recebidos dois dias depois. Alterar o procedimento e comunicar a mudança em 31 de janeiro impediu que as direções conseguissem fazer orçamentos e efetuar as compras. Isso atrasa a chegada dos materiais”.
Agravante
Outra preocupação do Sind-Rede/BH é que algumas direções, neste primeiro momento, enfrentem dificuldades para acessar os recursos das caixas escolares, já que cerca de 70% das instituições municipais passaram por uma mudança de gestão devido às eleições realizadas no final do ano passado. “Algumas escolas podem ter problemas com a ata de registro em cartório dos novos diretores, o que é corriqueiro. Os cartórios seguem critérios rigorosos e, caso identifiquem algum erro, devolvem o documento para correção, o que pode atrasar o processo. Enquanto a alteração não é oficializada, as contas das caixas escolares permanecem bloqueadas”, explica Vanessa.
A representante do sindicato pondera que a aplicação do novo procedimento implica a falta de determinação prévia de como será feito o repasse dos recursos e a previsão deles para fazer a transferência para as caixas escolares. “Nós não estamos afirmando que o dinheiro não irá chegar ou que o problema não será sanado. O que estamos dizendo é que tem uma mudança e tem uma situação instável nesse momento, o que, na prática, gera uma consequência. Ou seja, os meninos estão na escola sem que haja até o momento é os materiais para eles estudarem”.
‘Fico muito decepcionada’
A notícia de que os kits escolares ainda não haviam chegado surpreendeu uma mãe. O filho dela, de 6 anos, cursa o 2º ano do ensino fundamental em uma escola da região da Pampulha. Ele é uma das muitas crianças que dependem desses materiais para acompanhar as atividades escolares adequadamente.
“A escola enviou um comunicado há poucos dias informando que a PBH não havia entregue os kits, mas que as mães poderiam buscar o material”, contou a mãe ao BHAZ. Segundo ela, a instituição montou kits improvisados com materiais escolares que estavam em estoque.
“Consegui uma agenda, quatro cadernos — geralmente são sete —, duas caixas de lápis de cor, uma borracha, tesoura e apontador. Isso era o que tinha disponível. Por exemplo, lápis de escrever não veio. Para complementar, precisei pegar os materiais do ano passado que ainda estavam em bom estado para ele estudar”, relatou.
Ela afirma que o kit é essencial para a família dela, tendo em vista que ela tem outros dois filhos. “São produtos muito caros. Começamos o ano confiando que a prefeitura vai arcar com as responsabilidades e as entregas. Então assim, fico muito decepcionada e surpresa em confiar em um governo que não está cumprindo o seu papel. Está faltando o básico, que é o lápis de escrever para as crianças. Isso não está sendo fornecido”, desabafa.
O BHAZ entrou em contato com a Secretaria Municipal de Educação para questionar se a gestão tem ciência dos impacto da medida, como alegam pais e professores, no planejamento das escolas e no processo de aprendizagem dos estudantes. Também foram solicitadas informações sobre o motivo da mudança na compra dos kits escolares, a razão pela qual a comunicação veio somente menos de uma semana para o início do ano letivo, se acredita que todas as instituições terão condições de arcar com essa despesa, se haverá repasse de verba ou previsão de recursos para as que não terão condições e quando os novos kits serão entregues aos alunos.
A Secretaria Municipal de Educação admitiu, em nota ao BHAZ, a mudança, e informou que as diretorias regionais foram orientadas sobre a sistemática. Ainda de acordo com a pasta, aquelas unidades que não dispõem de verba suficiente receberão repasses da Smed para a compra. Por fim, a Prefeitura ressalta “que não haverá impacto no processo de aprendizagem, pois todas as escolas possuem o material básico para iniciar o ano letivo”, ao contrário do relato de uma mãe ouvida pela reportagem