Ex-prefeito de Lagoa Santa responde a ação por favorecer empresa da esposa em licitação do transporte público

Reprodução/Facebook/Bhaz

O ex-prefeito de Lagoa Santa e atual candidato ao mesmo cargo eletivo, Rogério Avelar (PPS), é alvo de ação civil pública que aponta irregularidades na concorrência vencida pelo consórcio responsável por operar as linhas de ônibus da cidade nos últimos oito anos. O Lagoa Viva, grupo do qual faz parte uma empresa comandada pela família da esposa do político, teria sido favorecido quando ele estava à frente do executivo municipal, em 2008. O processo judicial, que se arrasta desde então, recebeu novos desdobramentos no último mês: a juíza Sandra Sallete da Silva, da 1ª Vara da Comarca de Lagoa Santa, nomeou um perito que analisará documentos da licitação. Avelar nega ter interferido na concessão do transporte público e diz que uma companhia especializada elaborou as cláusulas do edital.

A ação, apresentada ainda em 2008 pela Associação Comunitária dos Usuários de Transporte de Lagoa Santa (ACUT), é acompanhada pelo Ministério Público de Minas Gerais. Por meio de documentos encaminhados à Justiça, a entidade representativa argumenta que a Transrosa foi favorecida por cláusulas do edital da concorrência e, ainda, pela condução do processo que restringiram a participação de interessados na licitação. A empresa pertence a Patrícia Rezende Salomão Avelar, Paula Rezende Salomão e Pedro José Salomão Neto – respectivamente, esposa, cunhada e sogro do ex-prefeito réu no processo. A companhia, que desde a década de 1960 opera na cidade da Grande BH, formou o Consórcio Lagoa Viva para participar da concorrência alvo da denúncia.

Reprodução/Ministério da Fazenda
Reprodução/Ministério da Fazenda

A ACUT argumentou na ação civil pública que a prefeitura teria concedido, na prática, cerca de 45 dias para que as empresas apresentassem propostas com estudos complexos, como uma planta que listasse características geométricas das vias da cidade e diversos detalhes do então funcionamento do sistema de transporte municipal. Isso favoreceria a Transrosa, por meio do Consórcio Lagoa Viva, pois a empresa explorava a concessão há mais de 40 anos.

A defesa do ex-prefeito Rogério Avelar entrou com recursos solicitando a suspensão da ação e alegou, entre outros argumentos, que não foi demonstrada a prática de atos ilegais. Além disso, afirmou que o político não possui ligação direta com o Consórcio Lagoa Viva e que não há ilegalidade no fato de Patrícia Avelar ser sócia da Transrosa. Apesar das justificativas apresentadas, a juíza Sandra Sallete da Silva decidiu dar continuidade à apuração dos atos denunciados (confira o texto).

“É público e notório que cabe ao Poder Judiciário intervir e aferir se a Administração Pública exerceu sua atividade nos limites previstos no nosso ordenamento jurídico, não podem prevalecer, por ora, os argumentos dos Requeridos [Rogério Avelar e outros], pois a Requerente [ACUT] funda sua causa de pedir [a ação] tanto na ilegalidade da celebração do contrato de concessão de serviço público pela vencedora na licitação, quanto nas irregularidades contidas no edital que contraria o nosso ordenamento jurídico”, justificou a magistrada.

Desembargadores do Tribunal de Justiça de Minas Gerais seguiram a decisão da juíza da 1ª Vara da Comarca de Lagoa Santa, dando continuidade à ação. Ainda foram negados recursos apresentados pela Transrosa, que também é ré no processo. No último ano, a magistrada ordenou a análise pericial dos documentos apresentados (veja aqui). No mês passado, após as partes encaminharem listas com as contestações a serem avaliadas, um especialista foi nomeado para produzir laudos sobre o caso.

Procurado pelo Bhaz, Rogério Avelar explicou que o edital foi elaborado por uma empresa especializada em implementar processos licitatórios de grande porte em diversos estados brasileiros. “Esse grupo com especialistas no assunto seguiu todas as normas para fazer o certame. Não houve questionamento de empresas participantes. Tanto que a ACUT tentou barrar a licitação e não conseguiu, a juíza não concedeu a liminar. O pedido de esclarecimentos é democrático, continuaremos apresentando as informações solicitadas”, explicou.

Inicialmente, uma liminar que pedia a suspensão imediata da concorrência foi negada pela magistrada, que ponderou ser necessário ouvir os acusados e produzir provas contundentes antes de tomar tal decisão (veja).

Por meio de nota, o Consórcio Lagoa Viva destacou que a ação civil pública ajuizada no ano de 2008 envolve o município de Lagoa Santa. O grupo disse acreditar que a abertura do processo foi motivada por razões políticas e partidárias.

Decreto 2006

A polêmica envolvendo a concessão do transporte público municipal em Lagoa Santa se iniciou em 2006. Na época, veículos de imprensa de Minas Gerais repercutiram o fato do então prefeito Rogério Avelar ter assinado um decreto prorrogando por mais 10 anos o direito da Transrosa de explorar o serviço no município. A cobertura jornalística pontuava que a empresa da esposa do político foi beneficiada com a decisão.

A reportagem “De marido para mulher”, publicada pelo jornal Estado de Minas na época, inclusive está anexada à ação civil pública sobre o último processo licitatório. A ACUT alegou que a pressão pública levou o Executivo municipal a abrir a concorrência dois anos após o escândalo.

Reprodução/Estado de Minas
Reprodução/Estado de Minas

Ao Bhaz, Rogério Avelar explicou que a prorrogação em 2006 seguiu normas previstas na legislação vigente e teve o intuito de garantir a continuidade da operação das linhas de ônibus enquanto a concessão passava por um processo de municipalização em Lagoa Santa. Até então, o Departamento de Estradas de Rodagem de Minas Gerais (DER) era responsável por gerenciar o serviço dentro das cidades da região metropolitana de BH.

“Foi necessário prorrogar a concessão com o objetivo de não interromper as linhas. Para municipalizar o serviço, é preciso aprovar leis na Câmara. Não se trata de um processo imediato”, explicou o ex-prefeito.

Transporte público na berlinda

Enquanto segue o impasse diante das supostas irregularidades na licitação, moradores de regiões de Lagoa Santa mais distantes do Centro convivem com uma rotina marcada pela deficiência do sistema de transporte público. A reportagem do Bhaz esteve nos bairros Vila Maria e Palmital. Usuários de ônibus chegaram a afirmar que já aguardaram por quase três horas pela passagem de coletivos.

“Eu faço o trajeto do Palmital para o Santos Dumont. É horrível, principalmente nos finais de semana. Não é à toa que aqui tem perueiro. Estão tirando tirando até trocador em algumas viagens. O motorista tem que receber o dinheiro e demora mais”, conta a dona de casa Renata Karine Silva.

Dentro
Maira Monteiro/Bhaz

Os usuários contam que os ônibus estão bem conservados, mas quem mora fora da região central é muito prejudicado pela estrutura atual. “Os veículos têm boas condições, porém os trabalhadores que vivem aqui passam muito aperto. Tem colega meu que a empresa tem que trazer ele aqui no sábado e no domingo para não ficar horas no ponto”, diz Pedro Ferreira.

Desde a última quinta-feira (27), o Bhaz entrou em contato diversas vezes com a Prefeitura de Lagoa Santa para saber se existe algum tipo de fiscalização por parte do Executivo municipal diante das reclamações de moradores do Vila Maria e do Palmital, mas, até o momento, não recebeu nenhum retorno. Já o Consórcio Lagoa Viva informou que os quadros de horários são especificados conforme a demanda dos serviços e que, diante das informações apresentadas, será feito um novo um estudo para verificação do atendimento nos bairros citados (Palmital e Vila Maria).

Por meio de nota, o grupo que opera as linhas de ônibus municipais em Lagoa Santa ainda ressaltou que o fato de alguns veículos circularem sem a presença do cobrador é uma realidade mundial em cidades nas quais a bilhetagem eletrônica corresponde a maior parte dos pagamentos dos usuários, como é o caso do município da Grande BH. Além disso, qualquer redução de custos pode gerar revisão tarifária do serviço e beneficiar o usuário.

Maira Monteiro[email protected]

Diretora-executiva do BHAZ desde junho de 2018. Jornalista graduada pela PUC Minas, acumula mais de 15 anos de experiência em redações de veículos de imprensa, como Record TV e jornal Hoje em Dia, e em agências de comunicação com atuação em marketing digital, como na BCW Brasil.

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